“Em Itália, nada é mais definitivo do que o provisório”, li há tempos no Corriere della Sera, a propósito de o belíssimo “Fratelli d’Italia” só agora se ter tornado oficialmente o hino de Itália, ou seja, passados 71 anos (desde 1946!).
Na altura, logo o meu pensamento se focou também na nossa idiossincrasia, em muitos aspectos com contornos não muito diferentes da dos italianos. Neste caso, não no nosso hino, aliás, com uma letra de todo descabida nos tempos que passam. Mas, logo me foquei em impostos e taxas. E, percorri mentalmente, tributos inicialmente paridos como provisórios, que, com o tempo, se eternizaram, isto é, se tornaram consuetudinariamente definitivos…
Daqui parti para originalidades do nosso sistema fiscal. Já nem sequer falo na normalidade da anormalidade de pagarmos impostos cobrados sobre matéria colectável que, por sua vez, já contém impostos e bem pesados, de que os exemplos mais notórios são o IVA sobre o Imposto Automóvel contido na base tributária do custo do veículo e o mesmo IVA sobre o Imposto sobre Produtos Petrolíferos (ISP) que pagamos na gasolina e no gasóleo dos veículos.
Limito-me aqui a falar de um encavalitamento tributário absolutamente original datado da governação socialista de 2008 e continuado até agora, assim ganhando definitividade. Curiosamente ligado ao polémico tema do serviço público de rádio e televisão. Refiro-me à taxa ou contribuição para o audiovisual que se destina a financiar aquele serviço público, e que pagamos na factura da energia. É que sobre essa mesma taxa (que, aliás, se paga mesmo não tendo consumo radiofónico ou televisivo público) incide o omnipresente IVA!
Uma tributação ao arrepio de todas as normas de bom senso e razoabilidade fiscais. Uma originalidade tão absurda, quanto abusiva.
Diz o artigo 1º do Código do IVA que estão sujeitas a imposto as transmissões de bens e as prestações de serviços, a título oneroso.
Alguém, de boa-fé, acha que a contribuição obrigatória para o audiovisual (que, em 2018, atingirá 186,2 milhões de euros) se enquadra na letra e no espírito daquele Código? Alguém pode achar que esta contribuição é “uma transmissão de um bem ou uma prestação de serviço”?
Dir-se-á que o que está em causa do ponto de vista quantitativo não merece muita atenção, pois apenas se trata de lançar o IVA (à taxa reduzida de 6%) sobre uma taxa (2,85 € mensais) o que implica apenas mais 17,1 cêntimos por mês para cada contrato de electricidade, embora no total ainda vá render ao Estado mais de 11 milhões de euros.
A questão não é de quantidade. É de princípio. Esta medida é o espelho de como o Estado trata os contribuintes. Numa qualquer alínea perdida num mar de remissões das leis orçamentais, à socapa, criou-se e estabilizou-se uma nova e original forma de sacar dinheiro: um imposto sobre uma taxa, depois de já haver amiúde taxas sobre impostos! Original, sem dúvida. Só falta agora existir em versão completa um imposto sobre uma taxa sobre um imposto…
Curiosamente, safou-se desta sobrecarga do IVA uma outra taxa bem mais recente: a Taxa Municipal Turística que não lhe está sujeita nos termos do nº 2 do artigo 2º do Código. Para situações idênticas, tratamento diferente. É outro dos vícios do nosso sistema tributário cheio de remendos, interpretações administrativas, omissões e contradições! Assim se isentam desta anomalia os turistas e a continuam a suportar os residentes.
Se o Dr. Bagäo Félix, que já foi ministro das finanças, com responsabilidade directa sobre a arquitetura fiscal portuguesa, fica perplexo com estas originalidades fiscais, o que poderemos dizer nós, pobres contribuintes, cujo único remédio é aceitar a arbitrariedade de certas decisões?
Há dias coloquei aqui um comentário. Porque não publicaram?
Ou melhor, porque o apagaram?
A fiscalidade é uma arma eleitoralista e para financiar situações particulares e perversas.
Gostaria de colocar uma questão de fundo: estas trapalhadas fiscais resultam do roulement entre os partidos do centrão, ora temos PS em S.Bento ora temos PSD/CDS em S.Bento. Quanto a mim estes períodos de governação são muito curtos, não dá para estabilizar o conjunto de políticas necessárias . O partido X sobe ao poder e começa, de forma directa ou indirecta, a exercer pressões sobre os ocupantes dos lugares preenchidos por pessoas do partido Y. A Comissão citada para a selecção de quadros, comandada por um cidadão de nome Bilhim, pode propor mas, em última análise, quem decide e confirma as nomeações são as entidades governamentais.Parece uma charada, só para tolos verem e acreditarem. Portugal é um país engarrafado no Estado, a começar pela proeminente classe empresarial, que de empresarial tem pouco como todos sabemos, sempre encostada ao Estado – os parcos sete euritos da actualização do SMN em 2017 foram nota disso. Para 2018, na actualização do mesmo SMN, foi necessário deitar mão a outras compensações para o patronato. Um patronado que, quando convém, se declara como possuindo débeis situações económico-financeiros. Não é de admirar a falta de qualificações da mão-de-obra, pois oferecem salários miseráveis, em situações de precariedade, a pessoas com elevados graus de instrução, que preferem emigrar. Cabe na cabeça de alguém propor salários de pouco mais de 600 euros a licenciados e mestres? Preferem, além de emigrar, trabalhar para a distribuição e actividades semelhantes, no anonimato da sua condição, acabam por ganhar o mesmo mas não sofrem em tão elevado grau de humilhação. A frustração e a revolta vão crescendo… E o país, para beneficiar este estado de coisas, vai-se afundando e não prepara o futuro.
Num país como Portugal,pobre e desigual, a tentação do enriquecimento ilícito é fatal, como todos conhecemos. E sabemos pelos casos BPN, BES e Operação Marquês.
O mal, uma vez mais, está na crise dos partidos políticos. Os quadros dirigentes são pouco qualificados: veja-se a reforma das freguesias levada pelo ex-dr. Relvas, sem noção do que sejam as necessidades das populações do interior e do problema do êxodo para o litoral e da consequente desertificação. É preciso rectificar o que foi mal feito.Mais valia ter estado mudo e quedo, este ex-governante. A impreparação do ex-primeiro-ministro, Passos Coelho, foi notória. Ele não tinha a mínima noção do meio interno e externo onde se movimentava, sem experiência nem formação adequada para as funções que lhe estavam cometidas.
É preciso resolver a crise dos partidos políticos. Em toda a Europa, o debate está aberto; a crise de lideranças, atingindo inclusivamente aqueles que se julgavam sólidos – vide a descida abrupta de Merkel, estando no horizonte a sua retirada do CDU. É preciso, pelo menos em Portugal, substituir o sistema eleitoral. Já não lugar para voluntarismos: a tralha do centrão deve ser removida de vez.