A subida do rating da República de Portugal em dois níveis, da classe “lixo” para a classe “investimento” pela segunda das três principais agências de rating, a Fitch, é uma boa notícia, que, pelo menos, sustentará as taxas de juro aos níveis actuais. É mesmo possível que possa resultar numa redução adicional da taxa de juro da dívida pública portuguesa.
Note-se que a descida das taxas de juro da dívida pública portuguesa no último ano é surpreendente. Por exemplo, a taxa de juro da dívida a 7 anos caiu quase 2,1 pontos percentuais desde Dezembro de 2016 (vide figura). Cerca de metade desta redução ocorre após a subida de rating para classe investimento pela S&P (a 17 de Setembro de 2017), em resultado da expectativa de que as duas outras principais agências de rating subiriam também o rating para a classe investimento.
A taxa de juro média da dívida directa do Estado contraída no passado (taxa de juro implícita média) era de 3,2% em 2016. Actualmente toda a dívida com maturidades até 30 anos transacciona-se a taxas de juro inferiores, o que significa que a despesa com juros e a taxa de juro implícita da dívida directa do Estado estão numa tendência de forte queda, o que é muito positivo para as contas públicas, para as contas externas e para a economia portuguesa.
Considerando apenas parte dessa dívida – a dívida de médio e longo prazo, na sua maior parte Obrigações do Tesouro –, é de notar que a maturidade residual média dos 15,1 mil milhões de euros de dívida de médio e longo prazo emitida em 2017 é de 7,8 anos. As Obrigações do Tesouro com essa maturidade teriam actualmente uma taxa de juro de cerca de 1,4%, muito inferior à taxa de juro implícita média das Obrigações do Tesouro que, no final de 2016, era de cerca de 4%. Assim, quando a dívida que vence (ou dívida ao FMI) é substituída por nova dívida de médio e longo prazo emitida às taxas de juro actuais resultam enormes poupanças, de cerca de 400 milhões de euros por ano, por cada 15 mil milhões de euros de dívida antiga que é substituída por nova dívida.
Se as actuais taxas de juro se mantivessem durante vários anos, a despesa pública com juros tenderia a cair para menos de metade do nível registado em 2016 (8,2 mil milhões de euros, em contabilidade pública), criando uma folga orçamental crescente no Programa de Estabilidade de Portugal e contribuindo para uma redução mais acelerada da dívida pública.

É possível que as taxas de juro continuem a cair, o que é surpreendente porque já estão muito baixas para um país cuja dívida pública representará cerca de 127% do PIB no final de 2017. Isto ocorre porque, com a subida do rating para classe investimento por duas das três principais agências de rating, muitos investidores institucionais e fundos passivos (fundos que investem de forma automática simplesmente de acordo com índices financeiros, com o objectivo de minimizar os custos de gestão do património) serão obrigados a comprar a dívida pública portuguesa de forma automática, independentemente do seu preço.
Ora não existe no mercado muita dívida pública portuguesa transaccionável em resultado: dos empréstimos contraídos junto do sector oficial (UE e FMI); das compras de dívida pelo BCE e BdP ao abrigo do PSPP; da preferência dos aforradores a retalho portugueses; e da política de gestão de dívida adoptada pelo IGCP.
O saldo global de Obrigações do Tesouro, no final de Outubro de 2017, era de 116 mil milhões de euros, 9,6 mil milhões de euros superior ao observado em Dezembro de 2010 antes do pedido de resgate. Desses 116 mil milhões de euros, 30,5 mil milhões de euros eram detidos pelo BCE e BdP no âmbito do programa alargado de compras de activos do BCE (PSPP). A Segurança Social detém títulos de dívida pública com um valor de mercado actual de cerca de 15 mil milhões de euros e o BCE ainda deterá aproximadamente 6-7 mil milhões de euros de dívida pública no âmbito do programa SMP.
Ou seja, o stock de Obrigações do Tesouro verdadeiramente transacionável em mercado será presentemente de cerca de 64 mil milhões de euros (33,6% do PIB), pouco mais de 60% do nível registado em 2010.
E a dívida pública de curto, médio e longo prazo que se transacciona nos mercados, excluindo dívida adquirida por BCE, BdP e Segurança Social, representa “apenas” 48% do PIB. É quase como se, no presente, esse fosse o nível de dívida pública de Portugal.
Acresce que o BCE e o BdP continuarão a adquirir, até Setembro de 2018, potencialmente cerca de 600 milhões de euros de dívida pública por mês. E que o IGCP planeia amortizar 6,7 mil milhões de euros de dívida que chega à maturidade em 2018.
Deste modo, se o IGCP mantiver a sua política, considerando as emissões previstas em 2018 no valor de 15 mil milhões de euros, o stock de obrigações do Tesouro transaccionáveis nos mercados poderá aumentar apenas 3 a 5 mil milhões de euros em 2018.
Por outro lado, também atendendo a que a descida da despesa com juros será mais expressiva do que o esperado, o défice público, tanto em 2017 como em 2018, deverá ser inferior aos valores previstos pelo Governo, respectivamente, 1,4% e 1,1%. Ou seja, as necessidades públicas de financiamento poderão vir a ser mais baixas.
Perspectiva-se pois, no mercado de dívida directa do Estado, um designado “short-squeeze” em que os preços da dívida sobem (e a taxa de juro cai), porque o mercado é pouco líquido e a oferta de Obrigações do Tesouro não deverá ser suficiente para fazer face às ordens de compra que, previsivelmente, irão ser feitas por diferentes grupos de investidores.
Leio este post e penso no conteúdo do debate quinzenal da Assembleia da República. São dois mundos distintos, não existe nenhum grau de intersecção.
De um lado o tom optimista do Governo: descida do desemprego(mas que desemprego? O desemprego à antiga ou o desemprego à alemã, com descidas representadas por mac-jobs? Qual a credibilidade das taxas de desemprego que são publicitadas?) E a descida da Dívida Pública? O post é claro, acabado o QE do BCE, os credores externos deterão a prazo qualquer coisa como 100% do PIB, mais ou menos 175 mil milhões de euros, isto num total de Dívida à volta de 250 mil milhões de euros. A tarefa continua ciclópica.
Qual é a validade de afirmar que a Dívida está a descer? Não é isso que a realidade mostra, embora a situação tenha melhorado, que, prudentemente, é melhor considerar em parte devida a factores externos favoráveis.
Do outro lado temos uma oposição que nada de razoável atalha. Fim de linha?
Muito bem, podemos então poupar como qualquer coisa como 4 mil milhões de euros em juros da dívida. Seria bom que, com este dinheiro, o Governo fizesse alguma coisa pela melhoria dos serviços públicos. Mas, a dívida é tão substancial que se calhar estamos condenados aos trabalhos inglórios de Sísifo.
O Japão e a China têm grandes dívidas mas as mesmas estão quase totalmente adstritas às instituições financeiras dos países respectivos. O Estado empresta ao Estado, e no caso do Japão o clima de deflação foi a consequência.O que ameaçando a China do mesmo modo acabe por ser pernicioso à escala mundial.
No caso de Portugal, o país está dependente de credores externos. E tudo está preso por arames: é o QE do BCE e é o boom do turismo. E a ajuda da conjuntura externa. São muitos if´s. Mas o SPD na Alemanha quer a pasta das Finanças no Governo de Merkel. O SPD não quer desaparecer do mapa político, como aconteceu a outros partidos social-democratas na Europa, prometendo virar à esquerda uma vez instalado na grande coligação. Uma oportunidade para a Europa e para Portugal?
Claro que os estados podem sempre criar moeda e deixar de fazer pactos de amizade com os banqueiros que lhes emprestam o dinheiro que os próprios criam do nada. A melhor oportunidade para a Europa, para Portugal (e sobretudo para o cidadão comum) seria isto.
Portugal criou moeda, através da política monetária do seu banco central antes do Euro. Resolveu os dois pedidos de assistência financeira. O último, em 1983, foi conseguido principalmente através da desvalorização do escudo e da utilização da ilusão monetária nos acordos patronato-sindicatos(aumentos salariais sempre abaixo da inflação, que chegou a atingir mais de 30% nos anos 80).
Portugal sai do Euro? João Ferreira do Amaral já demonstrou que a saída é o caminho mais racional. Como Portugal se livrará de uma dívida pública de cerca de 250 mil milhões de euros? Maior prazo de pagamento(maior maturidade média), perdão parcial, reestruturação, modificação, portanto, das regras actualmente em vigor(as regras draconianas do Tratado Orçamental…).O que estará ao alcance?Parece um assunto complexo e remoto…O fado vai continuar…Portugal irá continuar a transportar a pedra montanha acima e a pedra, incessantemente, escorregará montanha pelo efeito da gravidade alemã e voltará ao local onde estava; desceremos então a montanha e voltaremos a carregar a pedra num loop infinito?…Parece um jogo estranho mas é o que é…Um factor poderia ajudou Portugal e também ajudou a Inglaterra, numa situação semelhante, a existência de inflação alta, com efeito desvalorizador ..mas a inflação subjacente(sem custos de energia), apesar dos esforços do BCE, não passa de 1%, o que é muito curto para ajudar…
Não conheço o que aconteceu em Portugal em 1983. Os dados da Pordata indicam que entre 1978 e 1985 tivemos sempre inflação à volta dos 20% e não apenas em 1983. Para além disso duvido que o país tenha criado moeda sem se endividar a alguém (até porque se o fizesse não precisaria de assistência financeira) e muito menos para estimular a procura, a produção ou ambos. Relativamente ao problema da dívida pública parte da solução poderá passar precisamente por criar moeda. Isto se quisermos mesmo pagar a dívida.
A inflação andou perto dos 30% nos primeiros anos da década de 1980: em 1983, 24% não tanto mas em 1984-28,5%, conforme confirmei na consulta à Pordata. Tinha a ideia que andou pelos 30% aquando da segunda intervenção do FMI nesse ano de .1983. As reservas de ouro, pelo menos parte delas e criadas nos tempos do Estado Novo, foram vendidas e entraram nas contas na altura. Para ser rigoroso só consultando na Biblioteca Nacional a imprensa escrita na Imprensa Nacional.
A desvalorização monetária permitiu o aumento das exportações(vende-se mais barato mas vende-se mais),com saldo decrescente negativo na balança comercial, visando também a diminuição das importações(comprar tornou-se mais caro, pelo efeito desvalorização). A balança de capitais pelo efeito remessa de emigrantes, na altura de grande expressão, tornou-se equilibrada. Tudo devia culminar também na diminuição do saldo da Balança de Transacções Correntes e consequentemente da Balança de Pagamentos, onde o FMI, entidade financiadora, incidia a sua atenção e controlo da situação. As duas figuras centrais nas negociações, por parte de Portugal, foram Mário Soares, o primeiro-ministro e o ministro das finanças, Ernani Lopes..
Portugal, nos tempos actuais, para criar moeda, ou melhor, depreciar a moeda, o escudo, só saindo do Euro. Actualmente só existe um país no mundo que cria moeda por o dólar dos EUA beneficiar da confiança de todos os intervenientes no comércio mundial, principalmente das grandes economias. Tem-se afirmado que a China aspira a competir com os EUA neste domínio.
Mas nós não precisamos de desvalorizar especialmente a moeda. Apenas precisamos de nos libertar de um sistema em que todo o dinheiro é criado como dívida e em que se promove constantemente a crença de que o estado só pode financiar serviços públicos se endividar mais ou carregar mais nos impostos.
Sobre os esquemas financeiros montados nos anos 80 e os seus porquês não faço muita ideia mas sei que se o problema era falta de dinheiro (em escudos) não era preciso exportar mais nem ficar dependente de remessas de imigrantes. Era só criá-lo e injectá-lo onde ele fazia falta. Afinal de contas o dinheiro é sempre criado por alguém (os bancos). Mas porque não pelos estados e instituições democráticas? Apenas por causa de interesses que não têm em consideração o bem estar público.
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