Os decisores no topo das instituições – do governo em particular – tendem a viver em redomas de vidro. Sempre foi e continua a ser assim, não obstante o acesso aos media e às novas tecnologias de informação que permitem, hoje em dia, conhecer melhor a realidade que nos rodeia. Mas cada dia tem apenas 24 horas. Se esses decisores estão rodeados de pessoas como eles (i.e., que também vivem em redomas de vidro) ou de subordinados com receio de dizer a verdade, ou ainda de bajuladores, é natural o desenvolvimento de um sentimento de auto-satisfação. E exige muita disciplina e capacidade de auto-crítica para se ser capaz de “descer à terra”. Raros decisores as têm na proporção necessária.
Acresce que os decisores tendem a controlar a agenda mediática e, o simples facto de utilizarem as instituições para contar a sua versão da história, permite a propaganda e a influência sobre o registo dos factos para a posteridade.
Por exemplo, parece haver um sentimento de forte auto-satisfação no topo da hierarquia do Banco de Portugal, com a resolução bancária que foi realizada no BES: em circunstâncias difíceis, com pouco tempo, fez-se pela primeira vez em Portugal uma resolução bancária de um banco com importância sistémica. Evitou-se o colapso do banco, o pânico dos depositantes e assegurou-se a estabilidade do Novo Banco.
Se não houvesse críticas, se não houvesse protestos, o que passaria para a opinião pública e para a posteridade seria uma “história de sucesso”, portanto, de contentamento e satisfação, ignorando “pormenores” no mínimo complicados como: o facto de as autoridades terem sido apanhadas de surpresa com o desabar do grupo GES; os erros cometidos ao longo do processo de resolução bancária; os enormes custos que dele resultaram.
Por isso, os protestos dos lesados do BES (saliento aqui este grupo, sem menosprezar outros que se têm feito ouvir em defesa das respectivas causas) têm sido organizados de forma inteligente e obrigam os governantes a “descer à terra”.
Os protestos dos lesados do BES – os mais recentes, na arruada do PS/PSD no mercado de Braga, bem como junto do Museu da Electricidade onde se realizava o debate Pedro Passos Coelho/ António Costa – penetraram, por momentos, a redoma de vidro, levando o Primeiro-Ministro a prometer uma solução ridícula e impraticável: uma subscrição pública para financiar processos jurídicos contra gestores do BES, chutando a bola para a frente e deixando os lesados, na prática, sem qualquer solução. A redoma de vidro não quebrou, mas abalou.
Estes protestos dos lesados do BES, pacíficos, não violentos, são um exemplo para o País. Os lesados do BES estão também eles a passar pelas 5 fases da “dor”, em que a negação e a raiva, dão progressivamente lugar à resignação, apatia e aceitação. Mas ao agir desta forma construtiva, organizada e persistente na defesa dos seus interesses, lutam pelo objectivo de recuperar o seu dinheiro e, parece-me, podem ser capazes de vir a alterar o que à partida lhes estava predestinado nesta resolução do BES.
Sim, os direitos defendem-se nos Tribunais, mas essa é uma solução de recurso quando tudo o resto falha. Numa democracia cabe aos responsáveis pelo normal funcionamento das instituições assegurar que a lei e a regulamentação sectorial é cumprida e impedir o atropelo desses direitos. É, por isso, legítima a indignação e os protestos dos que são atingidos por esses atropelos à lei e pelas falhas na supervisão. Os protestos não violentos dos lesados do BES são também um exemplo para os cidadãos que, ocupados com as preocupações do dia-a-dia, “nas suas próprias redomas de vidro”, se alheiam desse sofrimento alheio.
Só falharam em duas coisas. A primeira é que, com este governo, era evidente desde a primeira hora que só processando o estado é que podiam resolver alguma coisa.
A segunda foi na agressão, o Pedrinho bem merecia o olho negro durante a campanha.
Ainda não percebi…defende a utilização de dinheiro dos contribuintes para salvar investidores?
Pode começar transferindo o seu ordenado.
Não mexa no dinheiro dos contribuintes.
Não, o que se defende é ir ao bolso dos decisores: banqueiros, gestores bancários, governadores, vice-governadores, reguladores, governantes e todos os responsáveis pelo roubo.