As últimas semanas têm sido marcadas por incerteza crescente em relação à economia chinesa, bem como ao comportamento do mercado bolsista chinês e da taxa de câmbio dólar-yuan/renminbi.
A evolução dos mercados financeiros na China tem causado muita preocupação, pois pode prenunciar nova crise financeira, como aponta Francisco Louçã em post anterior. Vários economistas estrangeiros têm apelado à Reserva Federal americana para que não aumente as taxas de juro, com o receio do impacto de tal medida nos mercados financeiros e sobretudo nas economias asiáticas.
Taxa de Câmbio US Dólar-China Yuan

Fonte: onvista.de
Como se pode ver no gráfico acima, as alterações no mercado cambial têm sido relativamente diminutas. O Yuan vale menos 3,8% do que valia há um ano. Mas essas alterações são profundamente simbólicas e ”assustaram” as autoridades chinesas. Porque demonstraram que o dique chinês (a taxa de câmbio fixa imposta pelas autoridades chinesas) não é seguro e criaram dúvidas sobre se as autoridades serão capazes de manter a taxa de câmbio.
As autoridades chinesas, que aparentam ter aprendido alguma coisa com o que ocorreu na Rússia e na Suíça, têm respondido com um misto de medidas convencionais e não convencionais, mas denotam algum nervosismo.
Em relação às medidas “convencionais”, têm intervindo massivamente nos mercados cambiais e no mercado bolsista chinês:
– Estima-se que a China se viu forçada a vender obrigações do tesouro americano (entre 13 e 27 de Agosto, terá vendido pelo menos 106 mil milhões de dólares de obrigações americanas) para obter liquidez e evitar uma desvalorização mais acentuada do Yuan. Estima-se que o banco central da China tenha gasto, desde 11 de Agosto de 2015, cerca de 200 mil milhões de dólares a defender o Yuan.
– Segundo a Goldman Sachs, o governo chinês já gastou 211 mil milhões de euros na compra de acções chinesas em bolsa. Em essência, esta medida constitui uma transferência de dinheiros públicos a favor de especuladores e também de multimilionários chineses.
Em relação às medidas “não convencionais”, embora as autoridades chinesas tenham afirmado que não pretendem que a China especule nos mercados cambiais no longo prazo, têm-no feito no curto prazo, ao valorizar subitamente o Yuan quando o mercado espera que o Yuan desvalorize. E já reforçaram as medidas de controlo de capitais para precisamente combater a desvalorização da moeda.
A dimensão da intervenção das autoridades chinesas não deve deixar qualquer dúvida sobre a escala da crise que se avizinha.
Em Portugal, continuamos demasiadamente alheios a estes sinais de instabilidade do exterior.
Graças à clarividência privatizante do Governo Coelho & Portas SA, o Partido Comunista Chinês já tem mais poder em Portugal que o Partido Comunista Português! Aqui fica o modesto agradecimento de um português aliviado!
Em que medida é que Portugal poderia responder a esta instabilidade do exterior? Por outro lado, creio que que a iminência de uma crise nada tem a ver com a instabilidade chinesa, ela é sobretudo plausível pelo facto de o sistema financeiro continuar de olhos fechados quanto à origem real da instabilidade ao nível global. A crise aberta em 2007 definiu bem a origem do mal, que não é outra senão o próprio sistema financeiro e a sua habilidade em conceber ferramentas de lucro crescente e rápido. A crise asiática não é por isso uma causa, mas antes um meio por onde ela se afirma. Hoje, até se tornou um lugar-comum dizer que uma crise está iminente, é que o sistema opera através da resolução pontual dos problemas, por isso eles surgem a todo o momento e com cada vez mais frequência.
Caro Arons VC,
agradeço o seu pertinente comentário e irei preparar um post a abordar algumas das questões que suscita.
Em relação ao seu primeiro ponto, diria que o passo inicial seria reconhecer que tal instabilidade pode representar um problema e procurar identificar/enumerar possíveis medidas. Um segundo passo seria procurar aprender com os chineses (com os russos, com os suíços), i.e., o que fazem de bem, e o que fazem de errado.
Em relação às medidas, existem várias medidas possíveis. Parece-me que se deve evitar o uso de dinheiros públicos em estratégias que essencialmente são apostas financeiras especulativas (compras na bolsa, intervenções crescentes nos mercados cambiais), por exemplo, exigindo orçamentos e propostas fundamentadas, aprovadas pelo poder legislativo, antes de qualquer intervenção (nomeadamente de bancos centrais). Em segundo lugar, os bancos centrais, com diferentes alterações do enquadramento regulatório nas ultimas décadas, permitiram um aumento da alavancagem do sector financeiro que deve e pode ser corrigido.
Mas concordo com a apreciação que faz da instabilidade actual do sistema financeiro internacional.
Sabe Ricardo, por vezes penso que acreditar nas coisas é um bom antídoto contra as evidências, mas o problema é que, se nos colocamos dentro de um sistema a tentar desmontá-lo, utilizando as ferramentas que o caracterizam, o nosso esforço sai inglório pois as ferramentas estão viciadas e reproduzem sempre os mesmos erros. Keynes já questionava sobre esta forma de proceder e sentia-se profundamente diminuído pelo facto de ter que desenvolver a sua análise através de ferramentas e princípios caros à doutrina neoclássica. Espero positivamente pela reflexão que se propõe publicar quanto a soluções às questões que coloquei, Portugal precisa de muita imaginação para sair do enredo em que está mergulhado mas, a meu ver, essas soluções terão sempre que andar numa lógica de corte das amarras e isso pressupõe muita coragem e nenhuma condescendência Os bancos centrais dificilmente são solução contra os desígnios da finança, para isso teriam que ser, eles próprios, regulados e controlados por uma instância superior, a sua independência obriga os políticos a depender das determinações do sistema financeiro, coisa que se revela de um absurdo Kafkiano.
“Em essência, esta medida constitui uma transferência de dinheiros públicos a favor de especuladores e também de multimilionários chineses.” – Com governos amigos destes, quem precisa de inimigos?
Caro lj,
obrigado pelo seu comentário.
É necessário reconhecer que é difícil a esses decisores saber, ex-ante, qual a decisão correcta. Mas particularmente bancos centrais, em alguns casos com base em teses de livros de texto de macroeconomia, têm realizado intervenções nos mercados financeiros que são altamente especulativas e pouco fundamentadas ex-ante. Na maior parte dos casos saem-se mal e essas entidades públicas sofrem enormes perdas financeiras. Por isso, deve-se aprender com este tipo de erros e mudar procedimentos no futuro.