Tudo Menos Economia

Por

Bagão Félix, Francisco Louçã e Ricardo Cabral

Francisco Louçã

4 de Abril de 2015, 15:10

Por

Mas que pouca vergonha de números são estes, caro Tavares?

João Miguel Tavares decidiu-se a um dos desportos favoritos dos comentadores de direita: preconceituar Boaventura Sousa Santos e Manuel Carvalho da Silva. Suponho que eles agradecem e esperam que o Observador também não se esqueça deles.

O caso é este: como o ilustre primeiro-ministro, Tavares não percebe o que está a acontecer com os números do desemprego, depois de um “ajustamento” estatístico do INE e no quarto mês consecutivo em subida, logo quando se anuncia urbi et orbi que está tudo a correr bem. Mas, como um bom pistoleiro, na dúvida Tavares atira a matar contra o trabalho estatístico do Observatório sobre as Crises e Alternativas, que os seus preconceituados dirigem, porque não pode estar certo, ou simplesmente porque seria pecado consumado duvidar da bondade da salvação pela austeridade.

grafico URepare no entanto, caro Tavares, no gráfico ao lado. Não foi fabricado pelos preconceituados ou pelos seus apaniguados. É simplesmente o registo dos dados do INE (“desemprego” oficial) e dos Centros de Emprego (procura de emprego realmente registada). Há uma diferença de cento e cinquenta mil e é recente, antes de 2013 isto não acontecia. Alguma coisa bate mal nas estatísticas oficiais, não lhe parece? Dois organismos do Estado, gente seriíssima, com alguns dos chefes escolhidos pela coligação (que este jornal dá como certo que sensatamente verificou cartões de partido para as chefias nomeadas, na segurança social ou noutros departamentos), e dizem esta coisa espantosa: há menos desempregados “oficiais” do que gente desesperada à procura de emprego.

Eu bem sei que a única explicação para esta malandragem é a vontade sinistra de alguns energúmenos da oposição, que querem sabotar a confiança do país. Estou até certo de que foram nisso instruídos por Boaventura Sousa Santos e Carvalho da Silva. O problema, caro Tavares, é que são muitos.

Comentários

  1. Entre 1976 e 1981 estudei sociologia no ISCTE. Saí de lá licenciado.

    Aprendi muitas coisas. Ainda hoje revejo as sebentas. Tive grandes professores, de diversas orientações ideológicas, se assim se pode dizer: Braga da Cruz, Salgado Matos, Vilaverde Cabral, Maria Filomena Mónica, Jorge Vala, Serras Gago, Duarte Pimentel, Musicafredo, Mário Murteira, Edgar Rocha, Joaquim Pais de Brito, etc… Peço desculpa por não mencionar todos.

    Existe um texto fundamental e canónico do Professor Adérito Sedas Nunes, “Questões Preliminares sobre as Ciências Sociais”, editado pelo GIS, em princípios do anos 70, que o J.M.Tavares deveria consultar, ler e reler. A Sociologia é uma ciência que se presta a grande conflitualidade, precisamente porque trata do social. E, nem sempre, a adesão aos estudos de Sociologia ou de Ciências Sociais se faz, por parte dos estudantes, por razões de ideologia ou de propósitos de militância política. E nestas coisas da Sociologia, relativamente aos fenómenos sociais e a forma como os analisamos, existe uma barreira invisível: o máximo de consciência possível que podemos ter sobre as situações. E é isto que diferencia Tavares e Carvalho da Silva, como diria Goldman que teorizou sobre a questão.

    Posso descrever que, do meu curso, fizeram parte colegas que eram engenheiros de formação e, tendo sido brilhantes alunos, enveredaram pela carreira académica com grande sucesso. São reconhecidos como grandes professores e, nem de longe, se pode conjecturar, acerca deles, como J.M.Tavares o faz acerca dos académicos de Coimbra. Sou indiscreto e vou revelar os nomes desses três colegas de curso, pessoas conhecidas nos meios universitários: António Firmino da Costa, Eduardo Costa Dias e José Manuel Pinto Leite Viegas.

    Perante isto, só posso lamentar a forma como Tavares abordou o assunto. Aliás, tenho notado que Tavares tem um especial interesse por matérias da área de Sociologia. Li um texto de Tavares com referências a Durkheim; também já vi apreciações de Tavares sobre a Organização Científica do Trabalho, o Taylorismo. Se o Tavares pretender, as minhas sebentas da licenciatura de Sociologia estão à sua disposição. Acima de tudo, quer contribuir para a subida de qualidade do discurso de Tavares nas suas crónicas do “Público”, sempre que abordar assuntos da área de Sociologia.

    Nunca fiz da Sociologia e dos conhecimentos que adquiri ferramenta de trabalho ou de profissão. A área que sempre me apaixonou é a Matemática. É isso que estudo e continuarei a estudar, enquanto o destino mo conceder, como diria Álvaro de Campos, aliás, Fernando Pessoa.

    Mas é apaixonante ler textos académicos de Sociologia.

  2. Os dados estão aí e a desgraça está montada.
    Suspeito até que a desgraça seja maior se a crise de Angola se perpetuar – vão regressar mais umas dezenas de milhar para engrossar as estatísticas. E se a política conservadora na Europa se se mantiver intacta ou aumentar – chegada aos governos da direita xenófoba – o regresso dos Portugueses seja infinitamente mais elevado que os números que o ministro disponibiliza (subsídios) para os Portugueses que queiram regressar.
    O Tavares é um franco atirador e isso é sabido de todos; que o Dr. Carvalho da Silva ande aqui a fazer politica de terra queimada ainda antes da chegada de Cavaco Silva à politica, não é novidade; que o Dr. Boaventura diga uma coisa às Segundas, Quartas ou Sextas e outra coisa completamente diferente às Terças e Sábados é insofismável.

    Concluindo: Não nos governamos e nem nos deixamos governar.
    Olha que novidade.

  3. Excelente artigo, sobretudo depois de ler o que lhe deu origem, em: http://www.publico.pt/economia/noticia/mas-que-observatorio-e-este-1691053

    Pessoalmente tenho dúvidas se as democracias devem tolerar todo o tipo de «bujardas» em prole da liberdade de expressão; postas as coisas doutro modo: é lícito que uma democracia utilize métodos antidemocráticos para proteger a própria democracia? Eis uma questão que nunca foi cabalmente respondida. Há dias escutei uma interessantíssima entrevista na rádio ao Ministro do Emprego britânico, o polémico Duncan Smith, em que o jornalista o confrontou com a utilização perversa de indivíduos no fundo de desemprego para estagiar em empresas privadas, mantendo o subsídio de desemprego; ou seja, por outras palavras, o contribuinte britânico anda a alimentar empresas privadas. A dureza com que o jornalista questionou Duncan, que procurava a todo o custou esquivar-se, foi notável, a tal ponto que o Ministro, em desespero, questionou o jornalista se podia estar a fazer aquelas perguntas, ao que o dito respondeu: «Se o Sr. não está satisfeito, pode sair!» Mas isso é num país onde o sistema representativo funcionada desde, pelo menos, 1688.

    1. É curioso como sempre se levanta a questão da representatividade dos eleitos e se questionam os cargos por nomeação e não por eleição, mas não se questione a legitimadade dos jornalistas, nem sequer se coloque em causa a sua honorabilidade e independência de interesses mais ou menos obscuros.
      E não sei o que é que um jornalista “duro” atesta da maturidade da democracia e do sistema representativo ou tão só, da qualidade (alta ou baixa) da comunicação social. E sobre este assunto, o Reino Unido é pródigo em exemplos: bons, maus e horríveis.

  4. Caro Professor,
    não vou rebater os seus dados até porque estão certíssimos e eu, um caseirísssimo economista, isto é, sem formação para falar do assunto, não posso deixar de falar doutro assunto, a POLÍTICA PORCA deste PM que foi levado ao colo para o poder, depois do “bando dos quatro” (partidos, entenda-se) se entenderem para depôr o anterior governo;
    o BE, que à altura, era liderado pelo meu notável interlocutor, fez a sua parte: não tem um pouquinho de pudor pelo mal que com o seu contributo, grassa por esse País? O PM tem responsabilidades, mas e…quem o ajudou nos seus propósitos mesquinhos, não tem responsabilidades? HAJA VERGONHA.

    1. Só que o que escreve é falso. Não houve nenhum entendimento para “depor” Sócrates. O governo é que se demitiu (não tinha que o fazer) e pediu novas eleições (não tinha que o fazer) depois de ter sido recusado o PEC4, que evidentemente a esquerda recusaria (incluia privatizações e cortes nas pensões e salários, que a esquerda tinha sido eleita para recusar). Sócrates nunca fez um acordo com a esquerda, só fez acordos com o PSD até ao dia em que o PSD lhe tirou o tapete. Acho que os que defendem a austeridade dos vários PEC e as privatizações que o PS aprovou (CTT, EDP, ANA, TAP…) é que podem ter vergonha, têm motivo para isso.

    2. Caro Francisco Louçã, aprecio lê-lo apesar de frequentemente discordar de si. Lamento dizê-lo mas o que você escreveu é que é falso ou no minimo uma versão bastante simplista e distorcida daquilo que se passou. Houve um entendimento claro criado pela sua fantasia politica e por uma direita sedenta de poder. Se isso foi consciente ou não, isso é lá consigo. O governo era minoritário como você bem sabe, e perante a impossibilidade de implementar um programa de último recurso combinado com Bruxelas, de facto não tinha outra alternativa. Como consequência directa e sobejamente conhecida por antecipação, as privatizações que a “esquerda” ( que presumo que se restrinja a si e a quem o rodeia) não queria, aconteceram todas x 10 pela mão do seu primo mais as suas doses cavalares de austeridade. Você devia saber o que aí vinha, tudo em família. E o senhor e a sua “esquerda” nem tugiram nem mugiram. Nunca mais se viu aquela asafama…..aliás o senhor foi descansar. Quem tirou o tapete, caro Francisco foi você e sua “esquerda” e a vossa crónica incapacidade de ver mais longe, de exercer a arte do compromisso, e de assumir responsabilidades governativas, preferindo afinal a eterna trincheira e o quanto pior melhor. Se o PSD tirou o tapete a Sócrates, então vocês tiraram o tapete ao país.

    3. Que mau gosto, André. Sobre as questões de família nem lhe respondo porque é indigno. Mas sobre os factos, a constatação triste é que os governos do PS privatizaram muito mais do que Vítor Gaspar, que bem se bateu por chegar lá próximo. Quanto ao resto, percebo que alguém do PS entenda que o seu governo não se devia ter demitido, que não devia ter pedido eleições e que não as devia ter perdido. Mas isso é entre o André Castro e o José Sócrates.

  5. Há fatores que continuam a ser ignorados por Institutos, Economistas e Comentadores, e pelos Governos. Nos tempos que correm, o PIB de um País, ou de um Grupo de Países (UE por exemplo) pode subir, acompanhado de um Desemprego brutal.
    Basta que tudo se informatize.
    Foi e é assim na Agricultura, na Indústria e nos Serviços.

    O verdadeiro problema, e consequência do que atrás referi, é o Sistema de Financiamento da Segurança Social.
    Se não puserem os Robots e Similares a descontar para a SS, todo o sistema vai para o Buraco, e breve.

  6. Estimado Professor, os dados sobre desemprego e desempregados despertam sempre entusiasmo e discussão apaixonada. Seria confortável assumir que esses dados representam uma realidade – pessoas – de maneira imperfeita, mas aceitável, como base de trabalho para economistas e políticos.
    Os dados publicitados pelos organismos nacionais e da UE têm o mérito de inspirar a reflexão sobre o que as pessoas desempregadas manifestam, mas a sua utilização para conclusões científicas e apoio a decisões deve ser feita com respeito pela regra “menos é melhor”.

  7. É impossível os números baterem certo, porque a leitura do(s) governo(s) é sempre construída sob o paradigma da propaganda. Informação editada a lembrar o lápis azul de outros tempos, ignorantes transvestidos de sábios que todos os dias nos querem ver agradecidos pela sua imensa coragem e valentia na condução dos destinos da nação, e ainda bitaites em rajada porque as massas precisam de tudo muito bem discutido e explicado. Por isso temos os Tavares da vida, as mesas cada vez menos redondas, os roteiros deste e daquele. Insistimos em não dar um salto qualitativo, justamente porque há interesses e interessados em que fique tudo na mesma.

  8. Para os rapazolas do Público: E que tal introduzirem a opção “envio por email” aos artigos deste blog? Há quem não faça parte das “redes sociais”.

    1. Apoiado Mário
      Esta gente parte do princípio que fazer partes dessa redes ditas sociais é um dato absoluto para toda a alminha deste país e do mundo inteiro!!

  9. Boa tarde Prof. Louçã
    Infelizmente estamos contaminados por uma (des)informação envenenada de mentiras e servida por todo o tipo de jornaleiros ao serviço dum governo desgovernado por pessoas sem conciência.
    Os seus artigos são muito valiosos perante tanta desinformação. Parabens. Continue!

  10. Boa tarde amigo Francisco,

    Vamos fazer contas por alto? Regra três simples, pra simplificar, e arredondando para cima para auxiliar a sua tese. 700 mil está para 14% (o que dá uma população ativa de cerca de 5 milhões, para o ajudar), assim como 870 mil (olhômetro) está para? =17,4 % . Mesmo que os dois dados que falou no comentário acima se anulem, continuamos com 17,4 %, certo? Longe dos tais 29% do Observatório. Agora, olhem para a % de emigração…eu por exemplo não a declarei. Acredito nos números do Observatório, penso somente que a sua opinião não veio acrescentar nada de relevante.

    1. As contas não são essas, se me permite. Se se der ao trabalho de ler o barómetro do Observatório, encontrará os dados detalhados. Mas não foi isso que eu tratei no texto e é pelo meu texto que respondo: chamei simplesmente a atenção para o facto de o registo estatístico de “desempregados” ser insatisfatória e insuficiente. Desejo o seu bom regresso.

  11. Boa tarde caro Dr Francisco Louça. Queria tecer algumas considerações sobre o Desemprego/Emprego.
    1)Porque que não é referido que a maior parte das empresas que colocam anúncios no IEFP é para obter incentivos à contratação e isto sem falar nas falsas ofertas de emprego do IEFP ou nos CEI que substituem trabalhadores na função pública.
    2)A lei do trabalho permite estágios não remunerados de 3 meses.
    3)Porque não é referido que a maior parte das ofertas de emprego do IEFP colocadas pedem a 4ª Classe!Andamos a formar pessoas (cursos profissionais e superiores para que)?
    4)Porque que não é referido que o Desemprego entre Licenciados quando comparado entre não licenciados aumentou 110% entre 2011 e 2014.
    Por ultimo o mercado de trabalho no sector privado tornou-se ”Selvagem” desde estágios não remunerados, estágios profissionais entre outros.
    Recomendo a passagem pelo site Ganhem Vergonha. (Plataforma de denúncia de empregadores sem vergonha).

    http://ganhemvergonha.pt/

    https://pt-br.facebook.com/ganhemvergonha

    Cumprimentos
    Pedro e boa Páscoa.

  12. lol , esse Tavares agora também lhe estão a subir o vapores .. é por uma miuda… não é pelos números .. ele ha cada uma .. chiça

  13. Caro Francisco Louçã, uma vez que se puxou dos dados do IEFP, aconselho-o a ler a entrevista ao Jornal de Negócios em 25 de Fevereiro de 2014, dada pelo dirigente do Instituto de Emprego, onde essas e outras questões são respondidas: “Também em Janeiro, houve 933 mil pedidos de emprego. A que se refere este número?
    -Os pedidos de emprego não têm que ser de pessoas desempregadas, não é? Pode ser de pessoas que estão empregadas.”

    1. Claro que pode. Serão pessoas que procuram outro emprego. Mas serão só uma parte dessa diferença e talvez lhe valha a pena lembrar-se de que quem, estando desempregado, não vai ao centro de emprego durante quatro semanas, deixa de ser incluido na estatistica como “desempregado”. Mesmo que esteja desempregado. Se essa pessoa voltar depois ao Centro e procurar emprego, tem explicada uma parte da diferença.

Deixe uma resposta

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *

Tópicos

Pesquisa

Arquivo