Tudo Menos Economia

Por

Bagão Félix, Francisco Louçã e Ricardo Cabral

António Bagão Félix

6 de Julho de 2016, 07:40

Por

A Torre de Babel da União Europeia, sem o Reino Unido. E agora?

A_TORRE_BABELA União Europeia tem 24 línguas oficiais e de trabalho: 5 românicas (português, francês, espanhol, italiano e romeno), 5 germânicas (inglês, alemão, neerlandês, sueco e dinamarquês), 8 eslavas (polaco, checo, eslovaco, búlgaro, lituano, letão, croata e esloveno), 3 fino-úgricas (húngaro, finlandês e estoniano), 1 céltica (gaélico irlandês), a helénica (grego) e uma semita próxima do árabe, mas escrita em caracteres latinos (maltês).

Se a estes 24 idiomas oficiais juntarmos outras expressões com algum peso histórico, étnico, político ou regional, a “torre de Babel” ainda mais se complica. Citando apenas algumas das mais conhecidas: catalão e galês (consideradas línguas co-oficiais), corso, sardo, bretão, gaélico escocês, basco, luxemburguês, albanês, língua cigana (romani).

Consumado o Brexit, só 4 línguas se repetirão: o alemão (Alemanha e Áustria), o francês (França, Bélgica na Valónia e Luxemburgo), o neerlandês (Holanda e Bélgica na Flandres) e o grego (Grécia e Chipre).

Com a saída do Reino Unido, o inglês – a língua franca da globalização – fica numa posição política algo estranha. Só a Irlanda, e vá lá, Malta, o terão como idioma oficial, ainda que a par do gaélico e do maltês. Como se irá acomodar esta questão, sabendo-se que, nos dias de hoje, a língua que faz a ponte entre os diferentes e múltiplos idiomas continuará a ser o inglês?

Por curiosidade, em termos populacionais o “pódio linguístico” da União passará a ser o seguinte: em 1º lugar, o alemão (90 milhões de pessoas), em 2º lugar, o francês (72 milhões) e em 3º lugar, o italiano (61 milhões). O inglês representado apenas (e parcialmente) pela Irlanda e Malta surge em 18º lugar (4,5 milhões).

Segundo o sitio da União Europeia, há nos serviços da Comissão cerca de 1750 linguistas e 600 membros de pessoal de apoio, 600 intérpretes a tempo inteiro e 3000 intérpretes externos. Feitas as contas, os possíveis arranjos entre as línguas, para efeitos de tradução e de interpretação, são 552!

Lembro-me de, em algumas reuniões em que participei, como no ECOFIN, a diferença de tempo entre a intervenção original e a tradução (às vezes, imperfeita, senão mesmo errada) ser longuíssima e de muito se perder nesse ínterim. Por exemplo, passar de lituano para português ou de finlandês para grego, implica, julgo eu, passar por uma língua intermédia (em geral, o inglês) para, por fim, chegar ao destino dos receptores.

A pluralidade e diversidade linguísticas na União são uma riqueza, ao mesmo tempo que ainda constituem uma barreira para o seu entrosamento, apesar de o inglês – agora francamente minoritário – ser o meio privilegiado de comunicação. Talvez a solução esteja na imagem das faces do poliedro dada pelo Papa Francisco: “a união de todas as parcialidades que, na unidade, mantém a originalidade das parcialidades individuais. Nele (poliedro), nada se dissolve, nada se destrói, nada se domina, tudo se integra”.

Por outras palavras, e sobretudo para as gerações mais novas e vindouras, tudo vai passar pela expressão generalizada do bilinguismo: a língua materna e um segundo idioma. E, para este, o inglês tomou definitivamente a dianteira, enquanto a língua mais universal e “neutra”, na falta de um qualquer esperanto que fracassou.

Termino citando um texto publicado no PÚBLICO no passado dia 1 de Julho e intitulado “As línguas na Europa: o que mudará com o Brexit: “Nesta área o que faz falta à Europa é uma abordagem de política linguística que vá além da opção “por defeito” da simples submissão à hegemonia e ao domínio do inglês. Esta abordagem do multilinguismo só pode nascer de um debate aberto e democrático sobre o nosso futuro linguístico enquanto europeus.

Comentários

  1. A França pode ter perdido a batalha da língua mas ganhou outras guerras: o sistema métrico e o espírito da revolução Francesa prevalecem.
    Os Franceses são os que mais lutam por uma ideia nobre da Europa, a qual não se resume a um simples mercado desregulado como desejavam os Ingleses e a City.
    Fazer do Francês, essa bela língua, a segunda da União Europeia seria um justo reconhecimento a esse grande país ao qual tanto devemos.

    1. Essa do “espírito da revolução francesa” daria pano para mangas, e em boa verdade é muito a essa revolução que se deve a ascensão do Império Britânico e depois do Império Americano. A verdade é que a França foi incapaz de se reformar, e por isso comeu o pão que o Terror amassou, que Trafalgar amassou, que Waterloo amassou, que a Rússia amassou. Entre as muitas coisas que eu devo à França, não se conta certamente esse estrondoso fracasso de 1789, que ainda por cima tanto mal causou a Portugal, directamente. Mais recentemente, foi a França que criou a Europa política pós-1945, com a Alemanha a reboque, e penso que só por isso esse grande país tem um lugar especial. Para mim tem!

    2. Tem toda a razao a FRANCA e um grande PAIS com uma BELA lingua que deu o bem estar a mais de 800 mil portugueses, que em Portugal seriem uns miseraveis , ainda hoje se ve portugueses a imigrarem porque em Portugal a justica e so para os ricos e politicos corruptos.

  2. Não passarão muitas luas para termos de novo o Reino Unido na UE. Nada ficará como dantes, nem a UE nem o Reino Unido, mas a língua inglesa permanecerá na sua órbita.

    1. Falou a mesma pessoa que previu que o RU votaria na permanência na UE… Talvez só os jovens hoje verão a Inglaterra de volta na “Europa”, mas isso vai depender da dita Europa.

  3. Caro A. Bagão Félix, atenção à armadilha do “senão” vs. “se não”. O correcto é: “às vezes, imperfeita, se não mesmo errada”.
    Com simpatia,
    J.S.
    Lisboa

  4. A língua universal do Ocidente foi o latim, e o francês conheceu um período “glorioso” em que foi a língua da alta cultura, coisa que o inglês nunca foi. Os franceses deixaram escapar o passarinho da gaiola, e os anglo-saxões agrarraram-no com ambas as mãos, nomeadamente com uma política global de incentivo à língua inglesa junto das massas populacionais. São processos históricos muito lentos e incontroláveis, e eu não verei na minha vida nenhuma língua universal que não seja o inglês. É tola a ilusão de que estas coisas mudam por vontade de alguém, embora como eu disse antes os Estados possam favorecer e acelerar processos essencialmente livres. O inglês manter-se-á também na UE, embora acredite que a França possa tentar a sua ‘revanche’… Mas isso teria que ser um projecto de longo prazo.

    1. Outro projeto, mas a mais longo prazo é a língua de Vaca também ser de trabalho na União. Não há nada de mais universal!

  5. Caro Adriano, primeiro deixe-me só salientar que em Português se escreve EUA e Brasil. Concordo consigo que a força do Inglês vem dos EUA pois os EUA são neste momento a maior potência mundial. Já no caso do alemão, dizer que não interessa nada ó porque vem do alemão não vejo o sentido. O Alemão interessa pouco para já porque é terrivelmente difícil aprendê-lo, depois porque é falado por pouca gente no mundo e depois porque na europa compete com o Inglês, que bate qulquer outra língua.

    1. Obrigado pelas correcções. Talvez não me tenha expressado da melhor forma mas o sr. exprimiu-se melhor. Não existe país na UE (composta por múltiplas línguas e múltiplos países) que sozinho tenha poder económico para impor a sua língua ao mundo. Dos países europeus que produziram países que dão cartas na economia mundial temos Portugal, Espanha e Inglaterra (os holandeses atrasaram-se) assim sendo como é quase só na Alemanha que se fala Alemão, este não tem muita relevância a nível mundial. Dai escrever que como só interessa aos alemães não interessa a ninguém (a frase é obviamente falsa…uma tentativa de uma contradição hiperbólica mal sucedida, admito). Isto da língua mede-se aos palmos. Quem tem mais palmos é a China os EUA o Brasil a América dos espanhóis a Índia os árabes…

  6. O Esperanto fracassou? Sempre essa mesma lenga-lenga. O Esperanto não fracassou. Ele continua muito bem, obrigado. A questão é que ele atua nas proporções que pode. O movimento para a adoção do Esperanto não tem nem nunca teve grandes somas de dinheiros. Nunca foi apoiado de forma ampla. Há muita resistência e pouca ousadia pra enfrentar o status quo. Por outro lado, a língua inglesa possui uma base econômica muito forte. Justamente por isso a língua inglesa é o que é: devido ao poder econômico a que está ligada. Mas tirem a força econômica da língua inglesa e analisem de forma imparcial: vocês verão que o Esperanto está muito à frente do Inglês.

    1. Concordo inteiramente com o seu raciocínio que relaciona a língua com o poder económico. É óbvio que se a USA não fosse a economia que é, o inglês não interessaria a ninguém. Se a língua estivesse relacionada com cultura em vez de com economia não era o inglês com certeza a língua dominante. Não concordo com a conclusão (apresentada primeiro). O esperanto fracassou porque é uma língua desenhada especificamente com um propósito universal que nunca conquistou e precisamente pelas razões que apresenta. Que eu saiba só nos meios anarquistas e internacionalistas teve algum sucesso. É uma pena. Uma língua que se aprende numa semana.

  7. Não penso que a importância do inglês tenha alguma coisa a ver com Inglaterra. Nem a importância do português tem a ver com Portugal. Já a importância do alemão que tem a ver com a Alemanha e por isso não interessa a ninguém. Na realidade o inglês tem a ver com a USA o português com o Brazil. Quase que aposto também que os tradutores para português traduzem na realidade para brasileiro. Como nem o Brazil nem a USA pertencem à comunidade europeia nada vai mudar.

    1. Aposta errado porque os intérpretes da língua portuguesa são praticamente todos recrutados em Portugal.

    2. Tem muita razao os tradutores podem ser Portugueses mas nao se cansarem muito copiarem na lingua brasileira

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