Na noite em que foi anunciado o acordo no Eurogrupo, Paul Krugman apresentou-nos uma adivinha, lembrando Marlon Brando: o que resulta do cruzamento entre um padrinho da Mafia e um bando de ministros das finanças? A resposta dele é esta: alguém que nos faz uma proposta que não conseguimos compreender. Contra a nebulosa das ameaças, tentemos então compreender.
Do acordo, o governo grego conseguiu seis vantagens. A primeira, sobretudo dos dias anteriores, é um enorme impacto de simpatia entre a opinião pública europeia. A Alemanha nunca tinha sido desafiada e note, caro leitor ou leitora, o significado da conferência de imprensa de Varoufakis frente a Schauble para um trabalhador português (ou alemão): foi uma alegria numa época de tristezas. A segunda foi evitar a armadilha de Samaras, que tinha acordado com a troika novas medidas de austeridade para o fim de fevereiro (redução de pensões e aumento do IVA). A terceira foi voltar a poder usar a dívida pública como colateral para os empréstimos aos bancos nacionais. A quarta foi a pequena margem de manobra para o uso do saldo primário de 2015, permitindo readmitir funcionários públicos que tinham sido despedidos. A quinta é o reconhecimento de um processo de negociação da dívida, embora ainda indefinido. Finalmente, o ganho que é o reconhecimento do fim da troika, embora seja sobretudo simbólico – mas a política também se faz de símbolos.
Ao mesmo tempo, o acordo representa quatro grandes concessões. A Grécia aceitou a supervisão decisória sobre todas as suas medidas, num modelo pior do que o que fora proposto na segunda feira passada (e retirado por imposição de Merkel). Não há financiamento ponte, que seria incondicional, porque o financiamento virá em abril consoante a revisão dos resultados do acordo. E, hoje, será apresentada uma lista de medidas à aprovação europeia, pressão total desde a primeira semana. Em segundo lugar, o acordo vale por quatro e não por seis meses. O que é muito importante: mal o programa termine, a Grécia terá mais de 6 mil milhões a pagar ao BCE, logo ao BCE. Terceiro, Tsipras não pode mobilizar para a economia os fundos disponíveis para os bancos, como precisava. Quarto, o governo aceitou repor o saldo primário de 2016 em 4,5%, o que significaria novas medidas de austeridade.
Numa palavra, tudo se resolve nos próximos meses. Ganhar tempo, que tantas vezes é fundamental, é sempre não decidir tudo: pode servir para preparar uma resolução e vencer, como pode ser uma forma de adiar ou até de esperar.
Ora, o tempo é importante para a Europa. A União também ganhou margem de manobra, aliás: a pressão diminuiu e isso é negativo para Tsipras. Para mais, o governo grego não tem nem terá qualquer aliado entre os outros governos: o centro está alinhado com Merkel, porque esse é o efeito de uniformização política produzido pelas regras europeias, que só reconhecem os mercados financeiros. Dos partidos socialistas não “vêm reforços”, só vem austeridade. Mas, entretanto, o quadro institucional está a mudar radicalmente, porque o governo alemão, o tirano silencioso, passou a conduzir as negociações e as decisões. Numa palavra, sentou-se no trono. Dijsselbloem, em nome de Merkel e sem vergonha nem hesitação, retirou na segunda feira uma proposta de acordo negociada por Juncker e o presidente da Comissão Europeia desvaneceu-se. O fechamento institucional da Europa acelerou-se com esta crise e não tem remédio.
Para a Grécia, ganhar tempo pode ser útil. Mas o tempo tem um preço: em junho, no fim do acordo, ou a Grécia estabelece um novo programa de austeridade ou pedirá financiamento nos mercados, se não tiver uma alternativa de redução substancial e imediata do serviço da dívida. Ou seja, a sua restrição externa é imperativa. Até então, terá pouca capacidade de criar investimento e emprego e, portanto, a sua restrição interna mantém-se.
Dir-se-á que David pode enfrentar Golias, mas tem de ter uma pedra na funda. O governo grego negociou sem Plano B e o adversário percebeu que Varoufakis não admitia nem preparava a alternativa, que é a saída do euro. Merkel teve por isso a possibilidade de ser ela a escolher entre impor as condições do acordo, com algumas cedências, ou forçar a saída da Grécia: durante a semana, pareceu preferir a segunda opção, inclinou-se depois para o acordo que será trabalhado durante esta semana com novas imposições e humilhações.
Haverá assim quatro meses de chantagens. E de negociações políticas: como a dívida pública grega é detida predominantemente por instituições e não por fundos privados, ao contrário do que se passou com as anteriores grandes restruturações de dívida pública, toda a questão é política e entre Estados. Mas são negociações em que não há saída sem a resolução dos problemas de fundo. Em junho, quando se fechar a janela de oportunidade, ou fica um mau acordo e a continuação da austeridade, ou se abre a porta de saída.
Muito pode ser feito entretanto. Uma resolução bancária sistémica, como aqui sugeri, permitiria proteger o balanço dos bancos e a sua liquidez, abater a sua dívida, prepará-los para se protegerem de ataques pelo BCE e orientar o crédito para políticas de curto prazo de criação de emprego e de aumento da procura.
Em todo o caso, um prazo é um tempo que terminará. Em junho, haverá novas rondas de negociações depois deste quatro meses de dificuldades e, porventura, o povo grego será chamado a pronunciar-se sobre o que vem. Porque em última análise, é sempre a democracia que está a ser julgada: podemos decidir? Somos donos de nós próprios?
Dizia Varoufakis, lembrando o Livro XII da Odisseia, que, como Ulisses, prefere amarrar-se ao mastro quando passar pela ilha das sereias, para manter compromissos sólidos sem se desviar. A Grécia – e nós com ela – bem precisamos de um mastro forte e de velas abertas. Mas não são sedutoras sereias que temos que passar, são monstros bem mais ferozes. São hoje os nossos donos.
Que monte de ingenuidades se leem por aqui!
O portugal da dívida é o portugal que vive com dinheiro emprestado pelos outros paises, os mercados financeiros não são mais do que isso.
Mas para grandes males grandes remédios : a dívida é grande quiça impagavel com este crescimento económico anemico (que não irá alterar-se), logo só se resolveria com um imposto único para a colocar em 60% do PIB ( deixo os critérios de rateio à consideraçao dos mais eruditos ).
Mas para isso, os governos não poderiam contrair mais dívida o que é virtualmente impossível no actual quadro vigente.
Donde se comclui que a verdadeira humilhação nacional não foi a intervenção da troika mas o facto de ter havido um governo ( o de Sócrates, convém lembrá-lo ) que pediu um resgate nas vésperas duma bancarrota, logo sem condições de amenizar os termos do memorandum.
E é bom que não se esqueça isto…
isso da uniformização da política,
estás a ver se a compras de forma “forma” subreptícia.
… “fiscal target”
o prof. louça esta sempre a festejar as vitorias do futuro e esquece as derrotas de hoje. todos sabemos que o Syriza esta derrotado, na europa, e em casa, é uma questão de tempo.
Levanta-se uma onda de esperança da Grécia que deve ser fortalecida com Portugal e pela Espanha e assim teremos uma voz forte e uníssona contra esta nova ditadura que se passeia como democrática.
Uma onda que pode cair mas pode crescer depende de nós, cidadãos comuns da Europa.
Imagine-se Grécia, Portugal, Espanha e depois quem sabe uma França de Esquerda unida!
Ingénuo? Certamente mas não foi assim que se deram as principais conquistas?
Se os escravos não se tivessem levantado para Utopia?
De certo que quando se iniciou o processo revolucionário não passava de uma miragem, de um sonho frágil de uma onda de esperança ingénua e que os senhores julgavam controlada mas ganhou força e entrou por terra dentro destruindo as teias dos amos de então.
Não nos digam que somos livres só porque podemos dizer o que pensamos.
Hoje somos os mais tristes dos escravos porque somos prisioneiros à mercê dos nossos amos sem rosto e de nomeação vaga de “mercados financeiros” com a impressão de sermos homens e mulheres livres.
Pois eu tenho uma solução mais simples: a nossa Dívida são cerca de 220 mil milhões. Para ser gerível e respeitar os critérios deveria estar em 60% do PIB. Ora, se o PIB são cerca de 170 mil milhões, 60% são 102 mil milhões, o que obrigaria a uma redução da Dívida em 118 mil milhões. Dividido por 10 milhões de portugueses, dava 11,8 mil euros a cada um. Se nos propusermos resolver a questão em 3 anos, o montante que caberia a cada um seria 3.933 euros por pessoa/ano. Com uma chave de repartição adequada, que não isentasse ninguém, mas obviamente progressiva em função dos rendimentos, um imposto único de crise repartido mensalmente daria 327,75 euros por pessoa, em média. Faltaria encontrar a forma de obrigar as Empresas a assumir uma parte substancial deste imposto, e encontrar uma chave justa. Mesmo um desempregado poderia certamente contribuir nem que fosse com 1 euro todos os meses.
É uma proposta interessante mas nao se podia dividir por 10 milhoes de portugueses; a populaçao activa (em idade de trabalhar) do país é de cerca de 6 milhoes e, como diz, ha que contar com os desempregados. Por outro lado estou convencido que os emigrantes responderiam ao apelo, embora fosse uma contribuiçao contingente porque nao pagam impostos em Portugal. Se se colocasse o objectivo numa reduçao mais modesta da divida, digamos para 70 ou 80% do PIB, a executar em quatro anos já era bom. Era caso para se pensar numa proposta detalhada e organizar um referendum (julgo que bastam 10 mil assinaturas). A parte complicada era – o que exigir em troca do governo (deste e futuros) ? é muito perigoso dar dinheiro de barato aos governos, mesmo que eles agoram tenham de andar mais na linha em materia de déficits. Mas no minimo os governantes tinham de ficar obrigados a ir à Suecia ou Dinamarca para um curso sobre moralidade, ética e boas praticas de governo. Talvez pelo menos deixassemos de assistir ao espectaculo aviltante de ver os ministros e demais politicos a passearem-se em carros oficiais de luxo enquanto o povo anda a tenir. Nos paises nordicos os ministros andam frequentemente de autocarro e bicicleta nos seus afazares diarios. O governo francês acabou de aprovar medidas drasticas nesta materia onde espera poupar umas poucas centenas de milhoes de euros. Mas mais que a poupança é o simbolismo da medida que é importante. O que é preciso mesmo é mudar mentalidades, senao nao se vai a lado nenhum.
É uma ideia interessante que talvez valesse a pena trabalhar em detalhe para submeter a referendo; julgo que sao precisas so 10 mil assinaturas para promover um. Nao se podia é dividir por 10 milhoes de portugueses; a populaçao activa (em idade de tabalhar) é de cerca de 6 milhoes e, como diz, ha que contar que uma parte está desempregada. Estou certo que muitos emigrantes aderiam à ideia mas seria uma contribuiçao contingente porque nao pagam impostos em Portugal. Por outro lado podia-se baixar o objectivo para 70 ou 80% do PIB e talvez alargar o prazo por mais um ano. Ja era obra ! A parte complicada seria a das condiçoes a impor aos governos – este e futuros – a troco desta benesse. No minimo tinham de ficar obrigados a frequentarem um curso de moralidade e boas praticas de governo na Suecia ou Dinamarca. Talvez assim deixassemos de continuar a assistir ao espectaculo aviltante de ver os politicos a passearem-se em carros oficiais de luxo enquanto o povo tem de fazer todos os sacrificios. Naqueles paises os governantes andam normalmente de transportes publicos e bicicleta nos seus afazeres diarios. Mais decencia de grande parte dos politicos ja era um grande avanço em Portugal.
Levanta-se uma onda de esperança da Grécia que deve ser fortalecida com Portugal e pela Espanha e assim teremos uma voz forte e uníssona contra esta nova ditadura que se passeia como democrática.
Uma onda que pode cair mas pode crescer depende de nós, cidadãos comuns da Europa.
Imagine-se Grécia, Portugal, Espanha e depois quem sabe uma França de Esquerda unida!
Ingénuo? Certamente mas não foi assim que se deram as principais conquistas?
Se os escravos não se tivessem levantado para Utopia?
De certo que quando se iniciou o processo revolucionário não passava de uma miragem, de um sonho frágil de uma onda de esperança ingénua e que os senhores julgavam controlada mas ganhou força e entrou por terra dentro destruindo as teias dos amos de então.
Não nos digam que somos livres só porque podemos dizer o que pensamos.
Hoje somos os mais tristes dos escravos porque somos prisioneiros à mercê dos nossos amos sem rosto e de nomeação vaga de “mercados financeiros” com a impressão de sermos homens e mulheres livres.