Estava a ler a proposta de lei do OE 2015 e, entre outros artigos, deparei com este:
Artigo 212.º (Instituições particulares de solidariedade social e Santa Casada Misericórdia de Lisboa)
1 – Sem prejuízo do disposto no número seguinte, são repristinados, durante o ano de 2015, o n.º 2 do artigo 65.º da Lei n.º 16/2001, de 22 de Junho, e as alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 20/90, de 13 de Janeiro, alterado pela Lei n.º 52-C/96, de 27 de Dezembro, pelo Decreto-Lei n.º 323/98, de 30 de Outubro, pela Lei n.º 30-C/2000, de 29 de Dezembro, e pelo Decreto-Lei n.º 238/2006, de 20 de Dezembro, revogados pelo n.º 1 do artigo 130.º da Lei n.º 55-A/2010, de 31 de Dezembro.
Eis um entre muitos exemplos de como a lei é opaca e labiríntica para o comum dos mortais.
Recordo aqui dois diplomas anteriores. O Decreto-Lei 35/2010 de 15 de Abril começava assim (escrevo “começava” porque, entretanto, foi revogado 4 meses depois…):
Artigo 1º – “Os artigos 143.º e 144.º do Código do Processo Civil aprovado pelo Decreto -Lei n.º 44 129, de 28 de Dezembro de 1961, alterado pelo Decreto -Lei n.º 47 690, de 11 de Maio de 1967, pela Lei n.º 2140, de 14 de Março de 1969, pelo Decreto -Lei n.º 323/70, de 11 de Julho, pela Portaria n.º 439/74, de 10 de Julho, pelos Decretos -Leis nºs 261/75, de 27 de Maio, 165/76, de 1 de Março, 201/76, de 19 de Março, 366/76, de 15 de Maio, 605/76, de 24 de Julho, 738/76, de 16 de Outubro, 368/77, de 3 de Setembro, e 533/77, de 30 de Dezembro, pela Lei n.º 21/78, de 3 de Maio, pelos Decretos -Leis nºs 513 -X/79, de 27 de Dezembro, 207/80, de 1 de Julho, 457/80, de 10 de Outubro, 224/82, de 8 de Junho, e 400/82, de 23 de Setembro, pela Lei n.º 3/83, de 26 de Fevereiro, pelos Decretos -Leis nºs 128/83, de 12 de Março, 242/85, de 9 de Julho, 381 -A/85, de 28 de Setembro, e 177/86, de 2 de Julho, pela Lei n.º 31/86, de 29 de Agosto, pelos Decretos -Leis nºs 92/88, de 17 de Março, 321 -B/90, de 15 de Outubro, 211/91, de 14 de Junho, 132/93, de 23 de Abril, 227/94, de 8 de Setembro, 39/95, de 15 de Fevereiro, 329 -A/95, de 12 de Dezembro, pela Lei n.º 6/96, de 29 de Fevereiro, pelos Decretos -Leis nºs 180/96, de 25 de Setembro, 125/98, de 12 de Maio, 269/98, de 1 de Setembro, e 315/98, de 20 de Outubro, pela Lei n.º 3/99, de 13 de Janeiro, pelos Decretos -Leis nºs 375 -A/99, de 20 de Setembro, e 183/2000, de 10 de Agosto, pela Lei n.º 30 -D/2000, de 20 de Dezembro, pelos Decretos -Leis nºs 272/2001, de 13 de Outubro, e 323/2001, de 17 de Dezembro, pela Lei n.º 13/2002, de 19 de Fevereiro, e pelos Decretos -Leis nºs 38/2003, de 8 de Março, 199/2003, de 10 de Setembro, 324/2003, de 27 de Dezembro, e 53/2004, de 18 de Março, pela Leis n.º 6/2006, de 27 de Fevereiro, pelo Decreto -Lei n.º 76 -A/2006, de 29 de Março, pelas Leis n.º 14/2006, de 26 de Abril e 53 -A/2006, de 29 de Dezembro, pelos Decretos -Leis nºs 8/2007, de 17 de Janeiro, 303/2007, de 24 de Agosto, 34/2008, de 26 de Fevereiro, 116/2008, de 4 de Julho, pelas Leis nºs 52/2008, de 28 de Agosto, e 61/2008, de 31 de Outubro, pelo Decreto -Lei n.º 226/2008, de 20 de Novembro, e pela Lei n.º 29/2009, de 29 de Junho, passam a ter a seguinte redacção: Artigo 143. º […] ”
Mais expressiva ainda é a Lei 23/2013, de 5 de Março que “aprova o regime jurídico do processo de inventário, altera o Código Civil, o Código do Registo Predial, o Código do Registo Civil e o Código de Processo Civil”:
Artigo 1º – A presente lei aprova o regime jurídico do processo de inventário, altera o Código Civil, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 47 344, de 25 de Novembro de 1966, e alterado pelos Decretos -Leis nºs 67/75, de 19 de Fevereiro, 201/75, de 15 de Abril, 261/75, de 27 de maio, 561/76, de 17 de Julho, 605/76, de 24 de Julho, 293/77, de 20 de Julho, 496/77, de 25 de Novembro, 200 -C/80, de 24 de Junho, 236/80, de 18 de Julho, 328/81, de 4 de Dezembro, 262/83, de 16 de Junho, 225/84, de 6 de Julho, e 190/85, de 24 de Junho, pela Lei n.º 46/85, de 20 de Setembro, pelos Decretos -Leis nºs 381 -B/85, de 28 de Setembro, e 379/86, de 11 de Novembro, pela Lei n.º 24/89, de 1 de agosto, pelos Decretos -Leis nºs 321 -B/90, de 15 de Outubro, 257/91, de 18 de Julho, 423/91, de 30 de Outubro, 185/93, de 22 de maio, 227/94, de 8 de Setembro, 267/94, de 25 de Outubro, e 163/95, de 13 de Julho, pela Lei n.º 84/95, de 31 de agosto, pelos Decretos -Leis nºs 329 -A/95, de 12 de Dezembro, 14/96, de 6 de Março, 68/96, de 31 de maio, 35/97, de 31 de Janeiro, e 120/98, de 8 de maio, pelas Leis nºs 21/98, de 12 de maio, e 47/98, de 10 de agosto, pelo Decreto -Lei n.º 343/98, de 6 de Novembro, pelas Leis nºs 59/99, de 30 de Junho, e 16/2001, de 22 de Junho, pelos Decretos–Leis nºs 272/2001, de 13 de Outubro, 273/2001, de 13 de Outubro, 323/2001, de 17 de Dezembro, e 38/2003, de 8 de Março, pela Lei n.º 31/2003, de 22 de agosto, pelos Decretos -Leis nºs 199/2003, de 10 de Setembro, e 59/2004, de 19 de Março, pela Lei n.º 6/2006, de 27 de Fevereiro, pelo Decreto -Lei n.º 263 -A/2007, de 23 de Julho, pela Lei n.º 40/2007, de 24 de agosto, pelos Decretos -Leis nºs 324/2007, de 28 de Setembro, e 116/2008, de 4 de Julho, pelas Leis nºs 61/2008, de 31 de Outubro, e 14/2009, de 1 de Abril, pelo Decreto -Lei n.º 100/2009, de 11 de maio, e pelas Leis nºs 29/2009, de 29 de Junho, 103/2009, de 11 de Setembro, 9/2010, de 31 de Maio, 23/2010, de 30 de agosto, 24/2012, de 9 de Julho, 31/2012 e 32/2012, de 14 de agosto, o Código do Registo Predial, aprovado pelo Decreto -Lei n.º 224/84, de 6 de Julho, e alterado pelos Decretos -Leis nºs 355/85, de 2 de Setembro, 60/90, de 14 de Fevereiro, 80/92, de 7 de maio, 30/93, de 12 de Fevereiro, 255/93, de 15 de Julho, 227/94, de 8 de Setembro, 267/94, de 25 de Outubro, 67/96, de 31 de maio, 375 -A/99, de 20 de Setembro, 533/99, de 11 de Dezembro, 273/2001, de 13 de Outubro, 323/2001, de 17 de Dezembro, 38/2003, de 8 de Março, e 194/2003, de 23 de agosto, pela Lei n.º 6/2006, de 27 de Fevereiro, pelos Decretos -Leis nºs 263 -A/2007, de 23 de Julho, 34/2008, de 26 de Fevereiro, 116/2008, de 4 de Julho, e 122/2009, de 21 de maio, pela Lei n.º 29/2009, de 29 de Junho, e pelos Decretos -Leis nºs 185/2009, de 12 de agosto, e 209/2012, de 19 de Setembro, o Código do Registo Civil, aprovado pelo Decreto -Lei n.º 131/95, de 6 de Junho, com as alterações introduzidas pelos Decretos–Leis nºs 36/97, de 31 de Janeiro, 120/98, de 8 de maio, 375 -A/99, de 20 de Setembro, 228/2001, de 20 de agosto, 273/2001, de 13 de Outubro, 323/2001, de 17 de Dezembro, 113/2002, de 20 de Abril, 194/2003, de 23 de agosto, e 53/2004, de 18 de Março, pela Lei n.º 29/2007, de 2 de agosto, pelo Decreto -Lei n.º 324/2007, de 28 de Setembro, pela Lei n.º 61/2008, de 31 de Outubro, pelos Decretos -Leis nºs 247 -B/2008, de 30 de Dezembro, e 100/2009, de 11 de maio, pelas Leis nºs 29/2009, de 29 de Junho, 103/2009, de 11 de Setembro, e 7/2011, de 15 de Março, e pelo Decreto -Lei n.º 209/2012, de 19 de Setembro, e o Código de Processo Civil, aprovado pelo Decreto -Lei n.º 44 129, de 28 de Dezembro de 1961, e alterado pelo Decreto -Lei n.º 47 690, de 11 de maio de 1967, pela Lei n.º 2140, de 14 de Março de 1969, pelo Decreto -Lei n.º 323/70, de 11 de Julho, pelas Portarias nºs 642/73, de 27 de Setembro, e 439/74, de 10 de Julho, pelos Decretos -Leis nºs 261/75, de 27 de maio, 165/76, de 1 de Março, 201/76, de 19 de Março, 366/76, de 15 de maio, 605/76, de 24 de Julho, 738/76, de 16 de Outubro, 368/77, de 3 de Setembro, e 533/77, de 30 de Dezembro, pela Lei n.º 21/78, de 3 de maio, pelos Decretos -Leis nºs 513 -X/79, de 27 de Dezembro, 207/80, de 1 de Julho, 457/80, de 10 de Outubro, 224/82, de 8 de Junho, e 400/82, de 23 de Setembro, pela Lei n.º 3/83, de 26 de Fevereiro, pelos Decretos -Leis nºs 128/83, de 12 de Março, 242/85, de 9 de Julho, 381 -A/85, de 28 de Setembro, e 177/86, de 2 de Julho, pela Lei n.º 31/86, de 29 de agosto, pelos Decretos -Leis nºs 92/88, de 17 de Março, 321 -B/90, de 15 de Outubro, 211/91, de 14 de Junho, 132/93, de 23 de Abril, 227/94, de 8 de Setembro, 39/95, de 15 de Fevereiro, e 329 -A/95, de 12 de Dezembro, pela Lei n.º 6/96, de 29 de Fevereiro, pelos Decretos -Leis nºs 180/96, de 25 de Setembro, 125/98, de 12 de maio, 269/98, de 1 de Setembro, e 315/98, de 20 de Outubro, pela Lei n.º 3/99, de 13 de Janeiro, pelos Decretos -Leis nºs 375 -A/99, de 20 de Setembro, e 183/2000, de 10 de agosto, pela Lei n.º 30 -D/2000, de 20 de Dezembro, pelos Decretos -Leis nºs 272/2001, de 13 de Outubro, e 323/2001, de 17 de Dezembro, pela Lei n.º 13/2002, de 19 de Fevereiro, pelos Decretos -Leis nºs 38/2003, de 8 de Março, 199/2003, de 10 de Setembro, 324/2003, de 27 de Dezembro, e 53/2004, de 18 de Março, pela Lei n.º 6/2006, de 27 de Fevereiro, pelo Decreto -Lei n.º 76 -A/2006, de 29 de Março, pelas Leis nºs 14/2006, de 26 de Abril, e 53 -A/2006, de 29 de Dezembro, pelos Decretos -Leis nºs 8/2007, de 17 de Janeiro, 303/2007, de 24 de agosto, 34/2008, de 26 de Fevereiro, e 116/2008, de 4 de Julho, pelas Leis nºs 52/2008, de 28 de agosto, e 61/2008, de 31 de Outubro, pelo Decreto -Lei n.º 226/2008, de 20 de Novembro, pela Lei n.º 29/2009, de 29 de Junho, pelos Decretos -Leis nºs 35/2010, de 15 de Abril, e 52/2011, de 13 de Abril, e pelas Leis nºs 63/2011, de 14 de Dezembro, 31/2012, de 14 de agosto, e 60/2012, de 9 de Novembro.
Nestas duas leis, enumeram-se, respectivamente, 60 e 166 alterações legislativas! O Estado no seu melhor! O Simplex legislativo no seu esplendor! Um “sodoku jurídico” que fará certamente a delícia de muitos advogados e juristas.
Verdade se diga que esta maneira prolixa e apopléctica de legislar não é de agora, mas vem-se acentuando.
Precisamos de leis enxutas, entendíveis pela generalidade dos cidadãos, que não pervertam a hierarquia das normas (por exemplo, as leis orçamentais contêm disposições mais dignas de portarias ministeriais…), sem adjectivação abundante que transforma a norma jurídica em quase-promessa, declaração de intenções ou propósito pio que só desprestigia a Administração do Estado.
Touché. De facto, inaceitável a presente forma de legislar.
Isto assim é mesmo impossível. O Diário da República devia ser como a Wikipédia, em cada referencia dessas tinha um link para o texto referenciado. Até estão num formato similar, não parece tecnicamente difícil.
Mesmo assim ficava ilegível, mas permitia a comuns mortais interessados passar umas tardes de domingo “agradáveis”.
A tão falada reforma do estado, caso fosse algo mais que faz de conta, devia acabar com esta orgânica miserável,cuja responsabilidade deve caber em primeiro lugar à classe política.
Ainda bem que focou esta realidade com tanta clareza. Não fazia ideia que fosse tão grave. Uma razão mais para ver o nosso futuro com tristeza e desânimo.