O jornalista Paulo Querido apresentará no IV Encontro de Blogues uma comunicação sobre o fim da blogosfera.
Não sei os argumentos que tem – mas concordo que a blogosfera está a morrer.
Por um lado, há a adopção de serviços como o Twitter e outras plataformas de comunicação e de life streaming, que recuperam parte do conceito original de blogue.
Por outro, há precisamente o facto de a blogosfera ter perdido o seu conceito original e a identidade própria que a separava de outras formas de publicação.
Originalmente, um blogue era um espaço pessoal, com uma ordenação cronológica de entradas. Ora, o carácter pessoal já não é definidor de blogue (há bloggers amadores e profissionais, anónimos e famosos) e a única coisa que os blogues têm em comum é a forma (e, mesmo neste capítulo, não faltam “blogues” que têm optado por apresentar artigos contrariando a simples ordenação cronológica).
Como cada vez menos se diferencia do resto dos sites, a blogosfera tende para o desaparecimento. Algo que não é diferente do que o rodeia não existe por si.
Nesta linha, este artigo da Economist (sugerido pelo Paulo Querido) ajuda a perceber a morte da blogosfera:
Gone, in other words, is any sense that blogging as a technology is revolutionary, subversive or otherwise exalted, and this upsets some of its pioneers. Confirmed, however, is the idea that blogging is useful and versatile. In essence, it is a straightforward content-management system that posts updates in reverse-chronological order and allows comments and other social interactions. Viewed as such, blogging may “die” in much the same way that personal-digital assistants (PDAs) have died. A decade ago, PDAs were the preserve of digerati who liked using electronic address books and calendars. Now they are gone, but they are also ubiquitous, as features of almost every mobile phone.
Actualização Uma pequena clarificação: não quer tudo isto dizer que os blogues vão deixar de existir – vão é, pela ausência de pontos comuns, deixar de fazer sentido enquanto conjunto; ou seja, os blogues deixarão de formar uma blogosfera e passarão a estar dispersos, assumindo o papel de páginas pessoais, espaços de life streaming, secções de sites noticiosos, sites temáticos com objectivos comerciais, etc.
Apregoar “a morte da blogosfera” a sete ventos é algo que convém muito à imprensa mainstream porque é uma forma implícita de dizer aos leitores que os amadores independentes nunca poderão fazer face a estruturas hierárquicas e centralizadas que controlam dezenas de profissionais de produção de conteúdos. Acontece que existem muitos blogs de sucesso que continuam a ser escritos por bloggers em nome individual (Presse Citron e Korben na França, Nerdcore na Alemanha, 1001 Gatos e Contraditorium no Brasil, etc.). Apesar de se tratarem de bloggers profissionais, eles continuam a ter total liberdade para dizer o que lhes dá na real gana e esse é o grande poder da blogosfera.
Na verdade, quanto mais os bloggers se deixam seduzir por grandes grupos de comunicação social ou portais de Internet mais eles correm o risco de perder a sua espontaneidade e a sua voz própria. Justamente porque o que diferencia os media mainstream é aquela crença na escassez da publicação de conteúdos. Por mais que se queira, muitos sites online continuam a ser involuntariamente regidos pelo lema “All the news that’s fit to print” do New York Times.
Mas a blogosfera rompeu todas essas barreiras e com isso está a forçar os dinosauros a acompanharem o ritmo, a aderirem à abundância e a abraçarem a linkania. Por isso eu acho que a blogosfera está mais viva que nunca. Porque não só as suas ideias venceram como também o número de bloggers profissionais (ProAms?) que ganham dinheiro só com a sua actividade e que continuam independentes de grandes grupos editoriais nunca foi tão grande como hoje. Até há cinco anos atrás isso pura e simplesmente era impossível.
Em contrapartida, o número de jornalistas despedidos mesmo no meio online tem aumentado por aí acima. O facto do Economist e da Wired virem agora dizer que a blogosfera morreu só revela o seu desespero perante a incapacidade de se adaptar aos novos tempos. Quanto aos bloggers que desistiram e se retiraram para as twittadas, dos fracos não reza a história. Só faz falta quem cá está 😉
Miguel,
Os media mainstream nem foram assim tão afectados pelos blogues. Curiosamente, os blogues mais populares tendem a ser empreitadas comerciais, propriedade de empresas de media. Um blogue profissional, com um punhado de redactores contratados, departamento comercial e milhares de visitas por dia faz parte do mainstream.
O que argumento é que, como conjunto, os blogues já não são nada. Ou seja, a blogosfera não é uma “esfera” de coisa alguma.
É claro que continuarão a existir blogues independentes – mas não terão nada em comum com os restantes blogues, pelo que não faz sentido pô-los no mesmo saco. Por exemplo: este blogue (que faz parte do site do Público e é mantido no âmbito de funções profissionais) é radicalmente diferente de um blogue pessoal. Porquê dizer que são ambos parte da blogosfera?
O que está a morrer é a blogosfera (que implicava um certo sentimento de comunidade) e não o blogue (que é hoje uma mera forma de publicação).
O blogger Nicholas Carr também tem um artigo interessante sobre o assunto.
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João Pedro, o sentido da minha comunicação ao encontro é ligeiramente diferente na medida em que não associo, como tu fizeste aqui, fim e morte. Percebo, no entanto, a tua posição, expressa aliás com clareza. Concordo com os argumentos que usas: a esfera desapareceu. Não é preciso lentes especiais para ver a diferença entre o(s) entusiasmo(s) da(s) esfera(s) em 2003, 2004, 2005 e até 2006 e a falta dele em 2007/2008. Uma consulta a qualquer dos topes, apesar de todas as limitações destes, revela o distanciamento entre o blogging enquanto actividade digamos com objectivos profissionais (incluindo spinning e outras actividades provavelmente não remuneradas) e o blogging pessoal, diarístico.
Hoje, um blog diarístico novo não quebrará a barreira, não saltará para a front line da blogosfera. Ao contrário do que sucedia há 2,3 4 e 5 anos, em que bastava aparecer e “o mundo” dava por ele. Hoje só quebra a barreira e chega ao “centro” (ou ao que resta dele, pq tb o centro se modificou), e através dele aos media (ou, para os que odeiam a ideia dos media, ao eco na sociedade), o blogging com aptidões profissionais sérias.
Querer pretender o contrário disto… é muita pretensão. Podemos, e deveremos eventualmente, discutir com mais ou menos paixão para onde “vai” a auto-edição, como e onde se manterá o umbiguismo no ecosistema da web social e outras abordagens que já se fazem em todo o lado menos nas blogosferas portuguesas, imobilizadas nos seus casulos há já algum tempo.
Curiosamente: a minha comunicação não é directamente sobre nada disto
É curioso… Este tema teve o condão de ressuscitar uma discussão que parecia perdida em Portugal: o metabloguismo, o discurso autocentrado. Excepto a união de resistência ao fenómeno do moitaflorismo (sinónimo de dizer disparates mal educados sobre o que se ignora só porque nos meteram uma câmara à frente), não via bloggers discutirem o blogging há algum tempo.
E sei porquê — mas fica para os historiadores.
Mas é evidente que a blogosfera nunca foi um conjunto unificado! Manifestou sempre uma diversidade de interesses. Desde o início que houve uma “blogosfera” da direita e outra da esquerda; uma “blogosfera” dos blogs de música e outra dos de tecnologia. Creio que a mais-valia da diversidade da blogosfera sempre foi essa diversidade de pontos de vista e de ideias. De combate de ideias. E acho que isso nunca se irá perder totalmente, ainda que esse combate passe a revestir-se de outros contornos. Sempre existiram várias comunidades dentro da blogosfera. Em contrapartida, nunca existiu um bloco rígido e centralizado, uma grande congregação. Nunca existiu uma Associação de Bloggers.
Para além disso, quem acredita que a blogosfera morreu – mesmo que esta expressão seja usada em mero sentido figurado – esqueçe-se da importância que os fóruns de discussão continuaram e continuam a ter em Portugal.
Sinceramente, continuo a discordar desta ideologia fatalista da “morte da blogosfera”, mesmo que seja entendida em sentido figurado. Sempre pensei que a principal qualidade da blogosfera era, precisamente, a de possuir esse princípio da pluralidade formal e da diversidade de produção de conteúdos dos blogues. Afinal, pega-se neste facto – o da falta de unidade ou de conjunto dos blogues – para se anunciar a sua morte. Pelo contrário, nunca achei a blogosfera tão interessante como há um ano para cá. Mas isto sou eu que valorizo, precisamente, a dispersão de objectos virtuais, a diversidade de interesses que não estejam circunscritos num só círculo comunicacional fechado. O que caracterizou sempre a blogosfera não foi a liberdade na gestão virtual de cada blogue? Na produção de conteúdos?
O problema é que a blogosfera, digamos, democratizou-se, banalizou-se. Qualquer cidadão comum produz conteúdos num blogue. Deixou de fazer parte de uma certa elite como há meia dúzia de anos. E isso incomoda, porventura, certas cabeças pensantes da cibercultura que julgam ser as “primas-donas” da vanguarda virtual. E até aposto como estas figuras serão as primeiras a anunciar uma nova plataforma ou ferramenta excepcional de comunicação tecnológica que vão substituir os obsoletos blogues…
João Pedro, obrigado pela menção. Publico os slides de suporte à minha apresentação.
Sobre o fim da blogosfera, no Expresso multimedia: http://pauloquerido.net/t/1/
Victor Afonso, como escreveu o João Pedro, algo que não é diferente do que o rodeia não existe por si.
“Deixou de fazer parte de uma certa elite como há meia dúzia de anos”
Esta é uma falácia completa. E que irá ser repetida mais uns milhares de vezes.
Elite porquê? Porque tinha acesso à Internet? Qual é a fronteira, então? O número? É que… metade da população portuguesa ainda não tem acesso à Internet. Isso faz da outra metade uma “elite”? O milhão (por alto) de portugueses que se ligava à net há meia dúzia de anos é uma elite?
Cada um que chega traz com ele duas ideias. Primeira, a de que tudo é novo aqui, ele é um pioneiro. Segunda, de que antes dele isto era povoado por uma elite.
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