Tiago Rodrigues estreia hoje Três Dedos Abaixo do Joelho

Ana Dias Cordeiro percorre, a partir de Três Dedos Abaixo do Joelho, o espectáculo que Tiago Rodrigues estreia hoje no Teatro Nacional D. Maria II no âmbito do Alkantara Festival, os anos de censura teatral no período do Estado Novo. Histórias que recordam um tempo em que se dizia que o teatro era perigoso.

 

Três Dedos Abaixo do Joelho, a nova peça de Tiago Rodrigues, só existe porque houve em Portugal um Secretariado Nacional de Informação que controlava tudo o que subia ao palco. “Muito cuidado com o teatro” – era o lema da censura salazarista

Face a face ou de frente para o público, uma actriz e um actor em volta de uma personagem: a censura. Interpretam texto censurado ou de censores, com ironia ou escárnio quando expõem os falsos pretextos da proibição ou dissecam os pruridos dos funcionários do Estado Novo. Entram na cabeça dos censores para dar corpo ao texto – uma colagem de excertos de relatório burocrático com obras de autores cortados, proibidos ou aprovados – os contemporâneos, e sobretudo os portugueses, eram especialmente vigiados. José Cardoso Pires, Sttau Monteiro, Bernardo Santareno.

Ouvem-se fragmentos do Hamlet de Shakespeare, da Menina Júlia de Strindberg, do Desejo sob os Ulmeiros de Eugene O’Neill, da Andorra de Max Frisch. Pinter e Tchékhov também passam por aqui. Há frases de Aristófanes que podiam ser de censores. E há frases de censores que, fora do contexto, ganham uma dimensão lírica, porque são encenadas para esse efeito. Como no tempo da censura salazarista, em que um texto ganhava maior ou menor carga política conforme fosse encenado e interpretado.

O resultado: duas realidades em confronto que aqui se juntam, para retratar uma época – versão poética, não documental.

É assim que um encenador, Tiago Rodrigues, e dois actores, Isabel Abreu e Gonçalo Waddington, recriam a partir de terça-feira para o Alkantara Festival, em Três Dedos Abaixo do Joelho (até 3 de Junho), a censura que deixou marcas numa geração inteira de actores, encenadores, directores de teatros, autores. Os que dedicaram uma vida ao teatro declamado ou de revista, passaram pelo Parque Mayer e pelo teatro nacional ou criaram (a pulso) o Teatro Independente, prenúncio de uma via revolucionária; e os que saíram do país e se inspiraram em criações estrangeiras, contribuindo mais tarde para a renovação dos palcos portugueses.

No Teatro Nacional D. Maria II (TNDMII), em Lisboa, ela, a actriz Isabel Abreu, e ele, o actor Gonçalo Waddington – nascidos depois do 25 de Abril, como o encenador – devolvem as palavras ao palco e ao público. São palavras que, há 50 anos, não puderam ser ditas, ou que foram ditas para que outras não o fossem. “Gestos” em vez de “beijos”, “ternura” no lugar de “mel”, “oculta” para não se ousar “nua”. Para ler mais: http://ipsilon.publico.pt/teatro/texto.aspx?id=305385

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