Uma vergonha

Uma vergonha

 

Já por ocasião das eleições presidenciais, alertado por muitos leitores, coloquei esta questão: a situação de desprezo em que se encontram os emigrantes portugueses que, desejem exercer o seu direito de voto nos actos eleitorais do nosso país. Esta situação arrasta-se há longos anos e custa perceber como ainda nenhum governo resolveu este caso. Na passada segunda-feira, (18.01.2016), o PÚBLICO divulgou nas suas páginas um artigo da professora de Economia Portuguesa na Universidade de Paris IV – Sorbonne e também autarca na região de Paris, Cristina Semblano, “Os emigrantes e as eleições presidenciais: uma história de exclusão”, cuja leitura só nos pode fazer corar de vergonha. Ainda na sua edição de ontem, o PÚBLICO, a propósito destas eleições – escrevo ainda antes de saber os resultados finais – referindo dados oficiais, afirmava que para este acto de 2016 estavam inscritos 9.741.792 votantes. Estes dados, aliás, são, como se sabe, uma grande mentira, pois os cadernos eleitorais não estão actualizados. Fazendo alusão a esses mesmos dados, o PÚBLICO citava que estão inscritos nos consulados espalhados pelo mundo 302.282 emigrantes. Para já este número, face à população global emigrante portuguesa, é irrisório. Não creio que esta mínima parcela de inscritos possa significar um alheamento total dos nossos emigrantes das coisas do nosso país. Por melhor que estejam integrados nas comunidades estrangeiras onde vivem. Na sua grande maioria, as reportagens e depoimentos recolhidos junto dos emigrantes nega a existência desse alheamento. E por isso mesmo dos actos eleitorais que por cá se realizam. Tal situação só pode corresponder à pouca atenção que se dá à vasta colónia migrante portuguesa a viver nos mais diversos países do mundo e ao fraco trabalho de diplomacia política e económica exercido junto desses portugueses. Os nossos políticos só em determinadas e oportunísticas ocasiões gostam de referir a diáspora portuguesa. De resto, até preferem esconder os números exactos dos contingentes migratórios.

Mas, fazendo fé nesse escasso número de inscritos, o que, sobretudo, nos deve chocar são as condições garantidas ou proporcionadas a esses emigrantes portugueses. E essas condições de vergonhoso desrespeito crónico vêm claramente demonstradas no citado artigo da “nossa” autarca da região de Paris. Fixemo-nos, por exemplo, no caso de França. Os portugueses residentes nas regiões de Lille, Rouen, Reims e Nantes, se quiserem votar, terão de deslocar-se a Paris. Estas cidades, como diz Cristina Semblano, ficam à distância de Paris, respectivamente, de 225, 135, 144 e 384 quilómetros. Porém, situações destas, muito especialmente depois da última reorganização consular e de embaixadas, operada pelo aperto da crise, repetem-se na Alemanha, na Suíça, no Reino Unido, Luxemburgo. E isto para nem sequer falar no que acontece no Brasil, nos Estados Unidos, na Venezuela e outros países. Paulo Portas, principal obreiro desta reorganização, forçado pelas condições financeiras, terá seguido à risca o que então Passos Coelho pensava “que se lixem as eleições”.

Não obstante as apertadas condições financeiras que continuarão a macular muitas das decisões governativas, seria importante que a ministra da Presidência e da Modernização Administrativa, Manuela Leitão Marques, com grande vontade de levar a sério a reimplantação do Simplex, incluísse nesse programa a revisão desta situação dos emigrantes portugueses. É uma situação vexatória para um país que quer ter orgulho em ser exemplar nas práticas da democracia e que, para sê-lo, não pode adiar nem neste aspecto, como noutros, as garantias e condições para os portugueses da diáspora abandonarem definitivamente o seu Portugal. E já agora que o novo presidente – os presidentes gostam tanto de visitar as colónias emigrantes – ponha na sua agenda apoiar o governo na solução desta vergonhosa situação.

 

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