A mentira na agenda política e mediática

A mentira na agenda política e mediática
Desde o último plenário da Assembleia da República em que o tema central foi o debate sobre o Estado da Nação a palavra mentira ganhou desusado lugar na agenda política e mediática. Ali, provavelmente pelo resguardo de uma certa continência verbal, nunca se ouvira tanto esse epíteto. De um modo mais descarado, as expressões “menos verdade”, “inverdade”, “falso”, sem qualquer cordialidade diplomática, foram substituídas pela forte invectivação incorporada nessa palavra mentira. O próprio primeiro-ministro não foi poupado. Antes foi o mais fustigado. Porém, de bancada para bancada, esse acusador vocábulo bailou como nunca pela boca dos deputados.
É evidente que a intensificação da campanha eleitoral produz um clima de confronto por demais excitado e muito pouco controlado. Quando as relações interpartidárias são tão demarcadas por um estado de cínica hipocrisia não admira que o parâmetro “ser-mentira” ou “ser-verdade” seja a equação separadora das linhas discursivas de uma distorcida retórica parlamentar. Mas se não transmite uma mensagem saudável do relacionamento político que reina na “casa da democracia”, indica, sobretudo, um deplorável estado da nação.
Ora, na óbvia correlação existente entre a agenda política e a agenda mediática este clima de desconfiança transbordou para fora das paredes da AR. Não é que este sentimento não seja já uma das “pragas” que corrói a credibilidade da vida política. Todavia, na execução do papel institucional que a si própria a comunicação social atribui de permanente vigilante da actividade pública na defesa da democracia, a sua conduta não deve ser apenas a de emprestar os seus «megafones» para dar eco às lutas partidárias. Registando-as, tem o dever de desconstruí-las. O jornalismo tem de ser uma prática sobre a veracidade dos factos e das afirmações. Interrogo-me, por isso, se neste desbobinar de contos e pontos que são os discursos partidários de uma campanha eleitoral terá o jornal PÚBLICO de retransmiti-los todos? Não caberá na distinção entre informação e propaganda, objecção tão reclamada pelos representantes dos media aquando da discussão da legislação para as campanhas eleitorais, a acção de coar, filtrar, as afirmações atinentes a uma coisa e a outra? Porque deixar apenas para o leitor essa distinção? Se a lei obriga a qualquer mensagem de informação publicitária ter bem clara a indicação de PUB, porque não encimar essa indicação explícita nas afirmações de pura propaganda?

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