O jornalismo dos “cidadãos comuns”

O jornalismo dos «cidadãos comuns»
No passado dia 28 de Março, um grupo de assíduos e colaborantes leitores de jornais, e que se agrupam sob a condição particular de serem habituais escritores de cartas para os jornais, promoveu, na Casa do Concelho de Tomar, em Lisboa, um encontro para reflectirem sobre esta simples pergunta «porque escrevem para os jornais».
Respondendo ao convite que me foi dirigido, como provedor dos leitores do PÚBLICO, estive presente na qualidade de observador. Tanto quanto constatei não se trata de uma organização formal, mas de um movimento espontâneo articulado através de redes sociais e com blogues editados, com a preocupação de dar uma resposta a compromissos que assumem de cidadania participativa. «Escrevemos – é uma das conclusões deste encontro – para, fundamentalmente, manifestar uma opinião com intenção cívica e política». E acrescentam: «Quando as sociedades democráticas vivem as crises normais nas instituições que enformam a própria democracia, os meios de comunicação social são o último escape da liberdade das pessoas, derradeiro garante da palavra».
Este grupo que reuniu uma vintena de cidadãos não se arroga o direito de representação do mais vasto número de cidadãos que, habitualmente ou ocasionalmente, enviam cartas para as direcções dos jornais. Mas pretende que esse grupo aumente, multiplique as suas redes de contacto, e não desista de exercer uma participação activa que tem o carácter de um dever cívico. Escrever para os jornais, participar num fórum televisivo ou radiofónico – dizia um participante no encontro – é uma outra forma de ir para a rua protestar ou tomar parte numa manifestação. Reconhecem estes leitores a limitação de espaço que lhes está reservado por condicionamentos de planificação em custos e organização editorial, mas gostariam de ver esse «seu» espaço aumentado. Concordam que as suas cartas muitas vezes a exprimir um gesto espontâneo e reactivo se confrontam com os critérios editoriais que respeitam. Os assuntos sobre os quais escrevem nem sempre se enquadram numa actualidade das agendas mediáticas ou num jornal que, em estratégia de desenvolvimento, tenta a internacionalização por via on-line. Não negam a imperfeição formal que, certas vezes, marca a escrita destas suas cartas. Mas, rejeitam a «censura de gaveta» e, por isso, acham que este circuito deveria ser acarinhado pelos jornais numa interligação mais assídua com os seus autores.
Do debate que se prolongou todo o dia, ficaram expressas ideias e opiniões que relevam um entendimento positivo de como deve ser preservado e cultivado este circuito entre cidadãos e media. Coloquei aspas na designação «cidadãos comuns», pois sinceramente tenho algumas reticencias sempre que invoco esta designação. Com efeito, comporta uma distinção real, entre autores/actores reconhecidos e anónimos, mas, porventura, é desvirtuosa, e até estigmatizante, no eficaz funcionamento de uma verdadeira democracia.
Creio ser correcto afirmar que a secção Cartas à Directora é um espaço que o PÚBLICO consagra com importância e algum relevo. Como provedor, confesso, – talvez pelas minhas funções – que é a secção que logo vou à procura. Perceber os leitores e, em especial, nas suas expressões de discordância, protesto, crítica, sugestão, é decisivo para a garantia de um elo que fortalece sentido e transparência a um jornal. E é, sobretudo, obrigação para um jornal que quer estar ao serviço de uma sociedade democrática.

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