(Crónica da edição de 20 de Março de 2011)
Um dos desafios que se colocam a um jornalismo exigente é o de converter num discurso acessível à generalidade dos leitores a linguagem técnica e os conceitos científicos por vezes indispensáveis à correcta descrição e explicação do que é noticiado. E fazê-lo, o que nem sempre é fácil, sem que a simplificação operada para transmitir ideias complexas conduza à sua deturpação.
Os jornalistas especializados em diversas áreas temáticas sabem que essa é uma parte essencial da sua missão de serviço público, que exige uma competência própria para descodificar fenómenos e processos cuja compreensão é do interesse geral, mas passa pelo recurso a conhecimentos que implicam terminologias específicas ou se ocultam, por vezes, no jargão profissional. Nessa função mediadora, o que distingue o jornalismo de qualidade é a capacidade de informar com clareza, sem dispensar o rigor.
A especialização temática dos jornalistas contribui para favorecer o rigor, mas é, frequentemente, um obstáculo à clareza. Veja-se por exemplo como, neste período em que as notícias e análises de tema económico e financeiro tendem a interessar a um círculo mais alargado de leitores, a sua inteligibilidade depara tantas vezes com o obstáculo da terminologia (o famigerado “economês”) ou da não clarificação de certos conceitos mais complexos.
Com o jornalismo não especializado tende a passar-se o contrário: o redactor obrigado a recorrer à informação científica ou técnica necessária para explicar ou enquadrar um qualquer acontecimento procura ser facilmente compreendido por todos os leitores, e a intenção de se exprimir de forma clara e sugestiva pode redundar em menor atenção ao rigor informativo e conduzir ao erro. Para o evitar, não basta por vezes o cumprimento desse mandamento profissional não escrito que deve levar o jornalista, mesmo em luta contra o tempo, a interrogar-se sobre a pertinência de tudo o que escreve, em especial quando se trata de matéria com que esteja menos familiarizado. É preciso que na estrutura editorial prevaleça o mesmo espírito, mobilizando quando necessário os conhecimentos ou meios de acesso ao conhecimento que devem existir numa redacção.
Os erros de que falo podem ser muito relevantes quando estão em causa questões de segurança pública ou de percepção de riscos pelas populações. É assim no caso de que hoje me ocupo. Há precisamente um mês o PÚBLICO deu destaque, nas páginas de abertura, a um trabalho evocativo das catastróficas enxurradas que um ano antes deixaram na Madeira um rasto de mortes e destruição. Em várias peças, assinadas pelo jornalista Tolentino de Nóbrega, fazia-se o balanço da reconstrução, analisavam-se as causas que terão ampliado as consequências do desastre (com destaque para os erros nas políticas de ordenamento territorial), escrutinava-se a acção posterior do governo regional e de outras autoridades públicas e, sobretudo, alertava-se, com a contribuição de vários peritos, para falhas no planeamento destinado a evitar ou atenuar tragédias semelhantes. No conjunto, um trabalho oportuno e informado, que permitiu ao jornal afirmar, em editorial, que “a Madeira e o seu líder aprenderam pouco com a tragédia de 20 de Fevereiro de 2010”.
Como não há prevenção eficaz que possa dispensar estudos sérios de avaliação de riscos, o jornalista citou as conclusões e recomendações do Estudo de Avaliação do Risco de Aluviões na Ilha da Madeira, elaborado para o governo do Funchal por uma equipa interdisciplinar coordenada por peritos do Instituto Superior Técnico (IST), da Universidade da Madeira e do Laboratório Regional de Engenharia Civil. E dele colheu a ideia com que abriu uma das peças do destaque: “Um evento hidrológico com as características do 20 de Fevereiro só acontece de 100 em 100 anos”. Ou “de mil em mil anos se contadas seis a 12 horas [de chuva]”.
Esse ponto foi naturalmente destacado, como explica o jornalista, para que “todos tenham uma melhor percepção do risco e se envolvam na protecção das aluviões”. Sucede que o que se diz no relatório, e é correctamente citado mais adiante no seu texto, é que a chuva de 20 de Fevereiro, no período crítico, “correspondeu a um período de retorno da ordem de 80 a 100 anos, para a duração de uma hora, e a um período de retorno superior, da ordem de 1000 anos, para a duração de 6 a 12 horas”. O que está longe de ser a mesma coisa, podendo uma interpretação errónea desta afirmação prejudicar precisamente a correcta percepção dos riscos em causa.
Assim o entendeu António Betâmio de Almeida, professor do IST e coordenador do estudo referido, que enviou de imediato ao PÚBLICO uma nota em que alertava que a expressão “a chuva de 2010 só acontece de 100 em 100 anos”, atribuída pelo jornal às conclusões desse estudo, representa “uma interpretação perigosa e, em rigor, errada do conceito de período de retorno”. ” Com efeito” — explicava — “um evento com o período de retorno de 100 anos pode acontecer em cada ano hidrológico (…) e a probabilidade de uma ou mais cheias, com magnitude igual ou superior a uma cheia com o período de retorno de 100 anos, ocorrerem num período de 30 anos é 26%. Para um período de 100 anos essa probabilidade é 63%”.
Não tendo o jornal esclarecido posteriormente esta questão, o professor do IST enviou-me uma mensagem, chamando a atenção para a importância de corrigir o erro, que diz ser frequente e afectar “a comunicação e a percepção social do risco”, quando se referem cheias, sismos e outros desastres naturais. De facto, quando se atribui a um determinado fenómeno um “período de retorno” de um século e se comunica esse dado como significando que ele “só acontece de 100 em 100 anos”, é razoável antecipar que o leitor comum entenderá que os riscos da sua repetição num futuro mais ou menos próximo são bem inferiores aos que na verdade devem ser tidos em conta nas políticas destinadas a preveni-los.
A meu pedido, Betâmio de Almeida teve a gentileza de redigir, para os leitores do PÚBLICO, um esclarecimento acerca do significado científico da expressão “período de retorno”. Aconselho os interessados a consultá-lo mais adiante neste blogue, limitando-me a citar aqui dois pontos desse texto.
Primeiro: “Em rigor, o período de retorno (PR) corresponde ao intervalo de tempo ‘esperado’ (no sentido de ‘esperança matemática’) entre duas ocorrências sucessivas do tipo de acontecimento em causa. (…) Considere-se, por exemplo, o PR = 100 anos para uma cheia num determinado local. Então, essa cheia terá uma intensidade com a probabilidade de 0,01=1/100 (‘uma vez em cem’) de ser igualada ou excedida em cada ano (hidrológico)”. Mas “(…) é fundamental ter presente que se considera na análise probabilística o ‘funcionamento’ de uma ‘roleta da natureza’ e que esta funcionará em cada ano de modo independente. Assim, nada impede que essa cheia ocorra dois anos seguidos ou várias vezes no próximo período de cem anos ou que não ocorra nenhuma vez! Ao contrário do que a expressão parece significar, o fenómeno não é periódico”.
Segundo: ” (…) As probabilidades das situações que podem ocorrer podem ser calculadas. Assim, a título de exemplo, para o caso da cheia com PR de 100 anos obtêm-se os seguintes valores para as probabilidades de excedência: a) nos 100 anos seguintes =0,63; b) nos 70 anos seguintes = 0,50; c) nos 50 anos seguintes = 0,40. Perante estes valores, significativamente superiores ao valor anual de 0,01, o decisor ou a sociedade fica confortável com níveis de segurança de 50 ou 40%? Pode acontecer que a resposta seja positiva, mas merece uma reflexão”.
Nunca é tarde para esclarecer, nem para recordar as armadilhas que a linguagem científica pode tecer à comunicação jornalística.
Novidades na frente electrónica
O leitor Hugo Jorge não gostou de encontrar na edição on line do jornal um texto “que faz a chamada para um assunto editorial, para depois o quebrar logo ao segundo parágrafo e anunciar que o leitor pode ler o resto se comprar a revista” (Pública). E questiona se “o jornal tem o direito de utilizar o espaço editorial para promoção”. Direito tem certamente, e o que valerá a pena discutir é se não se justificaria uma maior clareza na distinção gráfica de uma promoção como a que a leitor encontrou, que só se diferenciava do fluxo habitual das notícias por um pequeno antetítulo em que se lia “Exclusivo na Pública”.
Aproveito para esclarecer que a iniciativa antecipou uma mudança da política comercial do jornal, que terá início amanhã. “Decidimos” — informou-me a directora, Bárbara Reis — “deixar de publicar gratuitamente os conteúdos da revista no nosso site, mas não deixar de informar os leitores sobre eles. (…) Consideramos equilibrado dizer de forma clara aos leitores que os grandes temas semanais, as grandes reportagens e as grandes entrevistas que fazemos no dia-a-dia, e que implicam enormes investimentos orçamentais e da redacção, são conteúdos exclusivos para o papel e para os assinantes do PÚBLICO Online”.
Assim, a partir de amanhã, a versão on line (por assinatura) do jornal impresso será substituída pelo PÚBLICO e-paper, “novo formato de jornal electrónico” que incluirá o caderno P2 e todos os suplementos”, para além de um conjunto de novas funcionalidades “apenas possíveis numa plataforma digital”, e que, segundo Bárbara Reis, irão também amanhã ser comunicadas aos leitores. “A opinião, crónicas e críticas; os temas principais do caderno diário P2; o tema de capa do Ípsilon, o caderno cultural que sai às sextas-feiras, e os temas da revista Pública e do caderno Cidades, que saem ao domingo, são alguns dos conteúdos que passarão a ser exclusivos para assinantes on line“, explicou ainda a directora. José Queirós
Documentação complementar
“Nem tudo significa o que parece”
Esclarecimento sobre o conceito de ‘Período de Retorno’
A utilização frequente do conceito de período de retorno, para caracterizar acontecimentos extremos de natureza aleatória, propicia entendimentos confusos ou erróneos relativamente aos níveis de segurança associados. O referido conceito faz parte do vocabulário técnico dos especialistas em probabilidades e estatística e, nesse âmbito específico, não conduziria, em geral, a dificuldades. A questão coloca-se no plano da comunicação com o público e da respectiva percepção do risco, bem como com os pressupostos psicológicos subjacentes a decisões envolvendo critérios de decisão no domínio da segurança envolvendo acontecimentos aleatórios. Em rigor, o período de retorno (PR) corresponde ao intervalo de tempo ”esperado” (no sentido de “esperança matemática”) entre duas ocorrências sucessivas do tipo de acontecimento em causa. Demonstra-se que o respectivo valor numérico é igual ao inverso da probabilidade de ocorrência na unidade de tempo adoptada para PR. Corresponde a um valor ponderado entre todos os valores possíveis para o referido intervalo. Considere-se, por exemplo, o PR = 100 anos para uma cheia num determinado local. Então, essa cheia terá uma intensidade com a probabilidade de 0,01=1/100 (“uma vez em cem”) de ser igualada ou excedida em cada ano (hidrológico).
O primeiro problema coloca-se quando, no uso corrente da linguagem, se considera que, após uma ocorrência, o fenómeno “só” se repetirá após 100 anos. Errado! É fundamental ter presente que se considera na análise probabilística o “funcionamento” de uma “roleta da natureza” e que esta funcionará em cada ano de modo independente. Assim, nada impede que essa cheia ocorra dois anos seguidos ou várias vezes no próximo período de cem anos ou que não ocorra nenhuma vez! Ao contrário do que a expressão parece significar, o fenómeno não é periódico.
O segundo problema está associado ao entendimento da expressão “valor matematicamente esperado” que corresponde a um conceito conhecido desde o séc. XVII no âmbito dos jogos de azar. Na realidade, o referido “valor esperado” tenderá para o valor da média dos valores obtidos para sucessivos eventos, após um período de tempo muito, muito longo ( no exemplo, teríamos provavelmente de esperar uns 5000 anos para “comprovar”, experimentalmente, o período de retorno). Ora, na gestão de um risco específico (público ou privado), cada um de nós e a geração envolvida terão um número de anos limitado para usufruir e comprovar a segurança adoptada (e.g. 50, 70 a 100 anos). Esta circunstância altera completamente o significado prático e real do PR. Contudo, as probabilidades das situações que podem ocorrer podem ser calculadas. Assim, a título de exemplo, para o caso da cheia com PR de 100anos obtêm-se os seguintes valores para as probabilidades de excedência: a) nos 100 anos seguintes =0,63; b) nos 70 anos seguintes = 0,50; c) nos 50 anos seguintes = 0,40. Perante estes valores, significativamente superiores ao valor anual de 0,01, o decisor ou a Sociedade fica confortável com níveis de segurança de 50 ou 40%? Pode acontecer que a resposta seja positiva mas merece uma reflexão.
Se o leitor quiser “experimentar” ou “sentir” pessoalmente o conceito de “valor esperado”, pegue num dado com seis faces e escolha um número de marcas : o “quatro”, por exemplo. De acordo com a mesma teoria, o “número esperado de lances” (equivalente ao nosso PR!) para esse número sair é de seis. Sugiro que o leitor vá lançando o dado e que registe o número de sucessivos lances entre as saídas do “quatro”. Pode então verificar após quantos lances é que a média desses valores se aproxima de seis.
Em conclusão, proponho que se utilize com muita parcimónia a expressão “período de retorno”, em particular na comunicação com o público. Possivelmente há razões psicológicas, sociológicas ou históricas para justificar a aceitação e o uso do conceito por leigos, em particular a nossa atracção pelo PR=100anos, nomeadamente na legislação. No entanto, considero que a sua utilização na comunicação do risco ou da segurança pode ser (é) muito inconveniente. Defendo, para além do ano isolado, a consideração de horizontes de análise de 50, 70 ou 100 anos para avaliação dos níveis de segurança e de risco e a utilização de outras formas de comunicar ao público as probabilidades de referência.
Lisboa, 11 de Março de 2011
A. Betâmio de Almeida
(Prof. Emérito UTL/IST)
Alguma correspondência trocada
Nota relativa a notícias do PÚBLICO sobre enxurradas na ilha da Madeira em 20/2/2010 e publicadas em 20/2/2011
1- Relativamente ao assunto em epígrafe, vimos por este meio solicitar que seja corrigida a autoria de um Estudo referido no jornal e prestar dois esclarecimentos sobre afirmações que não são correctas, fazendo votos que estes esclarecimentos mereçam um destaque comparável ao das afirmações publicadas na edição em causa.
2- No texto é referido que o LNEC participou na elaboração do Estudo de Avaliação do Risco elaborado para a Secretaria Regional do Equipamento Social pelo IST, Universidade da Madeira e Laboratório Regional da Madeira e que tivemos o privilégio de coordenar. Na verdade e ao contrário do que o “Público” repetidamente afirma (pelo menos cinco vezes, incluindo o editorial da Direcção), o LNEC NÃO participou no referido estudo. Reconhecendo o elevado prestígio e qualidade do LNEC e a grande satisfação que temos sempre que trabalhamos em conjunto com equipas do LNEC, a verdade é que neste caso isso não aconteceu. Ficamos surpreendidos com a reiterada afirmação errada, não obstante as apresentações públicas do Estudo (a mais recente no IST, em Janeiro), a colocação do relatório síntese na Internet pela SRES e as notícias na comunicação social. Esta falha pode legitimamente levar à conclusão que o autor das notícias ou não consultou o Estudo original ou fez o trabalho de um modo muito superficial.
3- O “Público” afirma que o “(LNEC) revela que a chuva de 2010 só acontece de 100 em 100 anos”, fazendo, assim, uso de uma interpretação perigosa e, em rigor, errada do conceito de período de retorno. Com efeito, um evento com o período de retorno de 100 anos pode acontecer em cada ano hidrológico e podemos conhecer a probabilidade do evento ocorrer num período de anos consecutivos para o qual queiramos efectuar uma análise do risco. A título de exemplo refira-se que a probabilidade de uma ou mais cheias, com magnitude igual ou superior a uma cheia com o período de retorno de 100 anos, ocorrerem num período de 30 anos é 26% (1em 4). Para um período de 100 anos essa probabilidade é 63% (2 em 3). Estes exemplos mostram o perigo da interpretação errónea da notícia. O contacto directo com os especialistas teria sido útil.
4- Finalmente, importa esclarecer que, em paralelo com o Estudo, outras equipas de técnicos projectistas (independentes da referida anteriormente) têm estado a elaborar projectos de intervenção para a SRES de acordo com os princípios do Estudo (no que diz respeito a medidas estruturais). É de referir que a eficácia das medidas em curso só poderá ser verificada a longo prazo. Outras medidas sugeridas no Estudo deveriam de merecer a atenção das diversas entidades intervenientes. Fazemos votos que sim. Estas questões são do interesse público e a informação é uma componente fundamental de uma gestão do risco. Contudo, os erros e omissões tão flagrantes põe em causa a credibilidade das notícias, como é, infelizmente, o caso aqui referido.
Lisboa , 20 de Fevereiro de 2011-02-20
Os Coordenadores do Estudo IST, UM, LREC
António Betâmio de Almeida e Rodrigo Proença de Oliveira
Mensagem de António Betâmio de Almeida
O jornal Público teve a oportuna iniciativa de publicar textos referentes ao acontecimento de 20/2/2011 na Madeira. O texto do jornalista Tolentino de Nóbrega está, na generalidade, compatível com o tema e eu, na qualidade de leitor assíduo do jornal e coordenador de uma equipa que realizou um estudo de avaliação estratégica do risco relativo a esse evento, ficaria satisfeito com o Público se o mesmo não tivesse algumas falhas relevantes. (…) Na edição do dia 22/2 é publicada uma nota no “Público errou” na qual se corrige a autoria do Estudo. Surpreendentemente, essa nota tem novamente um lapso ao designar o LNEC como Instituto e não como Laboratório. Gostaria de chamar a atenção para dois pontos:
1- As gralhas com a autoria do Estudo são difíceis de entender. Com efeito, quem o consultou directamente o relatório-síntese ou teve acesso a outras notícias que já saíram na comunicação social ou teve a oportunidade de ter estado presente numa das sessões públicas (em 31 de Janeiro o Estudo foi apresentado e discutido no Salão Nobre do IST durante toda a tarde) sabe qual foi a instituição líder e a composição da parceria que elaborou o estudo. O modo como reiteradamente é referido o LNEC (nomeadamente no Editorial) em confusão com um laboratório da Madeira é estranho num jornal de referência.
2- A Direcção do Público não tem em conta os outros dois pontos: o ponto 4 é estranho na medida em que existem quatro equipas (que eu conheça e que participaram no debate no IST) a trabalhar em projectos especiais de protecção da zona do Funchal; um trabalho de preparação para um texto com data conhecida parece que poderia poderia ter identificado esta actividade; o ponto 3 é mais preocupante. Refere-se a um erro frequentemente associado ao conceito”período de retorno” com relevância para a comunicação e a percepção social do risco. No meu entendimento, a Direcção poderia (deveria) “aproveitar” esta oportunidade para esclarecer este assunto. Possivelmente a maioria dos que trabalham na comunicação social não domina este conceito e seria útil para o jornal e seus leitores solicitar ao autor do reparo que explicasse o assunto. Pessoalmente teria muito gosto em preparar uma pequena sessão dedicada aos profissionais do jornal. Ignorar olimpicamente o reparo é que não parece ser a melhor conduta. O mais triste da situação relatada é a multiplicação que os erros ou as omissões têm e a falta de confiança que geram no leitor, a perda de credibilidade. É intrigante que numa instituição que se preocupa, e bem, em salientar falhas em instituições, pessoas… na sua própria casa parece, parece falhar (parcialmente) no controlo da qualidade (…).
Lisboa, 23 de Fevereiro de 2011-02-23
A. Betâmio de Almeida
(Prof. Emérito UTL/IST)
Mensagem do jornalista Tolentino de Nóbrega
Não julgo ter havido “interpretação errónea”, como se pode verificar pela comparação dos textos (publicado e do Estudo) abaixo reproduzidos. Não existe sequer interpretação, mas simples transcrição do Estudo por mim consultado, com citações ipsis verbis. Para além do lapso já corrigido (Laboratório de Engenharia Civil regional e não nacional, o lugar onde o estudo foi apresentado, e daí o nosso lapso), não vejo onde estão “os erros e omissões tão flagrantes” que neste caso, como é referido, “põe em causa a credibilidade das notícias”.
Tratando-se de uma questão de interesse público, procurei divulgar as conclusões para que, como é defendido no Estudo, todos tenham uma melhor percepção do risco e se envolvam na protecção das aluviões. Sei do que falo. Aos quatro anos, tive de abandonar a minha casa na vila de Machico, inundada pela aluvião de 1956 e depois também em 1977 (provocando vários mortos), zona de risco que apesar do seu histórico não foi incluído no citado Estudo. Em 1993 e 2010 acompanhei intensamente o drama das vítimas de novas cheias por mim reportadas no PÚBLICO.
1- Citações da notícia publicada na edição de 20/2:
“Chuva de 2010 só acontece de 100 em 100 anos, revela LNEC. E de mil em mil anos se contadas seis a 12 horas” “Um evento hidrológico com as características do 20 de Fevereiro só acontece de 100 em 100 anos, conclui o Estudo de Avaliação do Risco de Aluviões na Madeira, apresentado há duas semanas no Laboratório Nacional de Engenharia Civil (LNEC)”. “(…) A análise aos dados disponíveis permitiu concluir que a chuva de 20 de Fevereiro de 2010, no período crítico, “correspondeu a um período de retorno da ordem de 80 a 100 anos, para a duração de uma hora, e a um período de retorno de 1.000 anos para a duração de seis a 12 horas”. Atendendo à limitação nos dados dos outros postos de monitorização, “não foi possível obter os períodos de retorno associados às precipitações sub-diárias na zona onde ocorreram as aluviões intensas”, como Machico, Ribeira Brava e S. Vicente”..
2- Citação do “Estudo de Avaliação do Risco de Aluviões na Ilha da Madeira” (Conclusões, pág. 169):
“(…) “A análise, no âmbito do estudo, dos elementos disponíveis permitiu concluir que a precipitação no dia 20 de Fevereiro de 2010, no período crítico do evento, registada no posto do IM Funchal, correspondeu a um período de retorno da ordem de 80 a 100 anos, para a duração de uma hora, e a um período de retorno superior, da ordem de 1.000 anos, para a duração de 6 a 12 horas. Atendendo à limitação nos dados dos restantes postos de monitorização, não foi possível obter os períodos de retorno associados às precipitações sub-diárias registadas nos diferentes postos da zona onde ocorreram as aluviões intensas. Contudo, face à análise do referido posto da cidade do Funchal é razoável concluir que o evento hidrológico que esteve associado às aluviões de 20 de Fevereiro de 2010 teve as características de um evento com um período de retorno da ordem dos 10 anos”.
24 de Fevereiro de 2011
Tolentino de Nóbrega
Novas mensagens de António Betâmio de Almeida
1) Alguns colegas e documentos da especialidade têm proposto alternativas mais adequadas para a comunicação do risco e da segurança. Inquéritos relativos à percepção público do risco e ao entendimento do conceito em causa [período de retorno] mostram o desfasamento relativamente ao significado real do mesmo (…) .
11 de Março de 2011
Betâmio de Almeida
2) (…)Por vezes tenho a impressão que o período de retorno é transmitido como um instrumento de defesa e ataque, que impeça uma reflexão ou uma explicação racional e com consequências sérias, tanto do lado dos cientistas como do lado dos cidadãos. Ontem o meu amigo Filipe Duarte Santos afirmou na TV que os cientistas não podiam prever o sismo [de 11 de Março, no Japão], mas podiam determinar o período de retorno. Mas, para um sismo de intensidade VIII, em Lisboa, o período de retorno será da ordem de 1000 anos(?).Qual o significado prático deste valor?
12 de Março de 2011
Betâmio de Almeida
“Novidades na frente electrónica”
Mensagem do leitor Hugo Jorge
Vi uma situação no vosso jornal que me incomodou bastante, já que tenho todo o respeito pelo vosso trabalho e principalmente pela vossa história. Trata-se de um título que faz a chamada para um assunto editorial, para depois o quebrar logo ao segundo parágrafo e anunciar que o leitor pode ler o resto se comprar a revista e aproveita ainda para promover os restantes temas? Isto será normal? E se, em vez da Pública, fosse outra marca promovida como o Sonasol, faria diferença? O jornal tem o direito de utilizar os espaço editorial para promoção? Ou não?
Janeiro de 2011
Hugo Jorge
Perguntas à direcção do PÚBLICO
O facto de os leitores do Público Online depararem com uma notícia aparentemente igual a todas as outras (com ressalva para o antetítulo “Exclusivo na Pública”) não poderá provocar confusão? Não se justificaria outra solução gráfica para a promoção? A iniciativa engloba-se em alguma alteração mais abrangente sobre conteúdos on line de acesso pago?
J.Q.
Resposta da directora do PÚBLICO
A ressalva [sobre o antetítulo] faz toda a diferença. Decidimos deixar de publicar gratuitamente os conteúdos da revista no nosso site, mas não deixar de informar os leitores sobre eles. O leitor pode não estar habituado, mas consideramos equilibrado dizer de forma clara aos leitores que os grandes temas semanais, as grandes reportagens e as grandes entrevistas que fazemos no dia-a-dia – e que implicam enormes investimentos orçamentais e da redacção – são conteúdos exclusivos para o papel e para os assinantes do PÚBLICO Online.
A partir de segunda-feira, 21 de Março, aliás, vamos lançar o PÚBLICO e-paper , o jornal electrónico, com novas funcionalidades. O novo formato de jornal electrónico tem tudo o que a edição impressa oferece, incluindo o caderno P2 e todos os suplementos, mais as funcionalidades que são apenas possíveis numa plataforma digital. O assinante vai ter acesso ao arquivo de artigos favoritos e pesquisa de edições antigas por palavra-chave; ao arquivo das 30 edições anteriores do jornal; à partilha de artigos em blogues e redes sociais; à exportação do conteúdo da edição impressa para o press reader (software de leitura offline), e alertas de e-mail diários com a capa do PÚBLICO e os suplementos.
A opinião, crónicas e críticas; os temas principais do caderno diário P2; o tema de capa do Ípsilon, o caderno cultural que sai às sextas-feiras, e os temas da revista Pública e do caderno Cidades, que saem ao domingo, são alguns dos conteúdos exclusivos para assinantes online. Com o crescimento da plataforma digital em todo o mundo, os jornais e leitores têm mudado a forma de se relacionar. E é natural que às vezes estas mudanças causem estranheza por parte de leitores e jornalistas. É uma nova era e estamos todos a adaptar-nos.
18 de Março de 2011
Bárbara Reis
Tem toda a razão. O erro já foi corrigido. Obrigado.José Queirós
Permita-me o Provedor: "(Crónica da edição de 20 de Fevereiro de 2011)"Não será Março? :)al