Títulos e verbos vistos à lupa

Atento à escolha das palavras utilizadas nos títulos do jornal, o leitor Joaquim Lopes enviou-me no passado dia 29 de Março a seguinte mensagem:


Títulos

Sem precisar de “andar à pesca” neste nosso tão querido jornal, vejo frequentemente coisas menos boas nos títulos. Hoje [29/3], por exemplo, a manchete dizia “Licenças para construção de casas novas em Lisboa caíram 75 por cento no ano passado”. Não seria preferível a palavra “baixaram” em vez de “caíram” para evitar a manobra de diversão mental, chamemos-lhe assim, do grupo inserido “…casas novas em Lisboa caíram…”? Pode comentar?
Também hoje e, quanto a mim, pior é o título do destaque na pág. 4: “Falta de peritos financeiros na PJ “entope” combate à corrupção”. Será que a falta de alguma coisa pode entupir outra coisa? Então e o excesso de? Ou trata-se apenas do frenesi de querer aplicar uma palavra forte? É que a chamada na primeira página utiliza apenas a palavra “ameaça”…
Ainda há dois dias, na sexta-feira, na pág. 14, a toda a largura, adiantava-se que “O rio mingou e mostrou o corpo de Leandro”. Mingou ou minguou? Da leitura do texto dá a ideia de que a mãe do infeliz menino terá dito “mingou”. Mesmo assim, será legítimo à jornalista levar isso a título sem aspas?
Ou será que, parafraseando, o facto de a revisão ter mingado no PÚBLICO acaba por entupir alguns dos títulos?
Joaquim Lopes


Resposta

É sempre bem-vinda a vigilância dos leitores nesta matéria de títulos, em que muitas vezes a busca da expressividade e o esforço de síntese conduzem a soluções menos felizes. Não me parece, no entanto, que estes sejam casos de especial infelicidade nas escolhas. Por partes:
No primeiro exemplo, mesmo que se admita que a solução proposta pelo leitor pudesse ser melhor, penso que só por exagero poderíamos temer que alguém concluísse, lendo o título, que se assistira a uma catastrófica queda de edifícios em Lisboa.
No segundo caso, concordo que a solução utilizada na capa é preferível, mas não creio que o recurso ao verbo “entupir” prejudique a inteligibilidade do que é noticiado.
Já a utilização do termo “mingar”, em vez de “minguar”, na notícia citada me suscitou a mesma dúvida que ao leitor. E, na dúvida, consultei o sempre útil serviço “Ciberdúvidas da Língua Portuguesa”, do qual recebi o seguinte esclarecimento: “Embora ‘minguar’ seja a forma preferível, o termo popular ‘mingar’ também é correcto”. Assim, e concordando na preferência pela forma canónica, compreendo a solução encontrada, que reproduz a expressão na forma popular, tal como foi ouvida pela repórter, e que não é errada. Não sendo por isso as aspas obrigatórias, não me parece que a qualidade do título ganhasse com a sua utilização. Mas aqui já estamos, caro leitor, a entrar no domínio do gosto…
José Queirós

Deixar um comentário

O seu email nunca será publicado ou partilhado.Os campos obrigatórios estão assinalados *

Podes usar estas tags e atributos de HTML:
<a href="" title=""> <abbr title=""> <acronym title=""> <b> <blockquote cite=""> <cite> <code> <del datetime=""> <em> <i> <q cite=""> <s> <strike> <strong>