Para que serve o jornalismo

[…] “Para que serve o jornalismo?” A pergunta, conhecida, foi repetida em certa ocasião pela revista digital Puro Periodismo, da Escola de Jornalismo da Universidade Alberto Hurtado, no Chile. Pouco depois do 4.º Congresso dos Jornalistas, realizado em Lisboa, vale a pena atentar em algumas respostas. Umas foram concisas: “O (bom) jornalismo serve para que os que sabem mais não se aproveitem dos que sabem menos”, afirmou Carola Fuentes, fundadora da produtora audiovisual La Ventana Cine. Outras apresentaram-se mais extensas. “Parece-me que essa pergunta tem mais do que uma resposta. O objectivo do jornalismo é informar, mas como há distintos tipos de jornalismo, essa informação serve para diversas coisas, não se pode meter tudo no mesmo saco”. Depois desta espécie de preâmbulo, Francisca Skoknic, subdirectora do Centro de Investigación e Información Periodística, sublinha o essencial: “O jornalismo que a mim me interessa é aquele que oferece informação às pessoas para que elas possam exercer melhor os seus direitos como cidadãos” – e não teria sido despropositado acrescentar que a informação também pode instar as pessoas a cumprirem os seus deveres. Esse jornalismo que interessa “inclui desde a cobertura crítica da forma como as autoridades governam e legislam até à divulgação de informação básica para que as pessoas possam tomar decisões no dia-a-dia”. Isto implica mostrar tudo aquilo que, por distintas razões, permanece oculto ao olhar dos cidadãos.
Nicolás Alonso, jornalista da revista Qué Pasa, diz algo idêntico. O jornalismo “é importante, claro, pelo seu objectivo principal: fiscalizar o poder”. Mas tem outros préstimos: “Dar voz a quem não a tem, gerar empatia entre realidades distantes, e sensibilizar para as diversas injustiças do mundo moderno”. O jornalismo poderá ainda “resgatar esses heróis anónimos, cujo exemplo se perde no meio do caos quotidiano”.
O jornalismo é como uma lente, considera Carolina Mascareño, jornalista de um dos mais lidos diários chilenos, La Tercera. É, diz ela, “uma ferramenta para recolher fragmentos de realidades distantes, como um telescópio que observa as estrelas e possibilita a construção de um relato sobre o universo para o levar a outras pessoas”. E é, ao mesmo tempo, “como um microscópio, que permite escrutinar, estabelecer as causas dos processos e fenómenos sociais e ampliar factos que escapam ao olhar apressado das pessoas”. Segundo Carolina Mascareño, os novos media vieram impor um esforço de adaptação para que “o trabalho desta lente chegue às pessoas como um relato com sentido e não como uma visão turva”.
Manifestando respeito pela crítica especializada, pela coluna de opinião e pelo jornalismo narrativo, David Ponce, crítico musical do El Mercurio On-Line, considera que não há tarefa jornalística mais útil do que fazer a agenda (a secção do jornal em que se publicam as informações sobre os colóquios, os espectáculos musicais, as exposições, as feiras, os filmes, as peças de teatro e o mais que estiver agendado para o dia). “Anónima, desprovida de ego, puro serviço, nenhum rosto, é o melhor índice de quanto importam a um meio de comunicação social os seus leitores”. A agenda, acrescenta, “é o antónimo de opinologia”, é informação para uso próprio. “É empoderamento, antes de ter sido inventada essa palavra: é o faz tu mesmo. Ou anda tu mesmo, ao teatro, ao concerto, ao museu, à rua”.
Menos culto de egos, menos tagarelice irrelevante, menos reprodução de comunicados e recados, menos truques, mais informação útil e comprovada, mais serviço, portanto, eis uma sugestão para estes tempos de crise do jornalismo.

Extracto de texto publicado hoje no jornal Diário do Minho.

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