
Passaram mais de 11 anos desde que os 15 países da então Comunidade Económica Europeia acordaram em Lisboa uma ambiciosa estratégia: converter a economia europeia “na economia baseada no conhecimento mais competitiva e dinâmica do mundo até 2010, capaz de um crescimento económico sustentável acompanhado de uma melhoria quantitativa e qualitativa do emprego, uma maior coesão social e do respeito pelo ambiente”.
A Europa falhou os objectivos traçados. As razões são muitas, mas a crise financeira que afectou a diferentes níveis a estrutura europeia é apontada como a principal razão pelo atraso e pela impossibilidade de alcançar as metas. No ano passado a nova Comissão Europeia apresentou uma nova estratégia em muito alinhada com a Estratégia de Lisboa: a Estratégia Europa 2020, que estabelece três prioridades que se reforçam mutuamente e proporcionam uma visão da Europa no século XXI. A prioridade número um é o crescimento inteligente, desenvolvendo uma economia baseada no conhecimento e na inovação. Ou seja uma economia baseada em ciência e tecnologia, a base do conhecimento e da inovação.
Neste contexto, é preocupante que a ciência tenha tão pouca presença nos programas eleitorais dos vários partidos políticos.
O Bloco de Esquerda diz que na ciência, como na saúde, na educação, na formação e no combate à pobreza, “só se mexe para melhor”, mas não formula qual a estratégia para a melhorar e quais as suas prioridades. Em 2009, o PCP no programa eleitoral para as eleições legislativas apelava a uma revisão do Sistema Científico e Tecnológico Nacional e do Estatuto da Carreira de Investigação Científica. No entanto no “Compromisso para a Mudança” para as eleições do próximo domingo, no sítio electrónico da CDU, não menciona de forma alguma a ciência. O programa eleitoral do PS não lança muitas pistas para o futuro; o do PSD tem um pouco mais de informação com enfoque na articulação entre universidades, centros de investigação e empresas. O CDS não apresenta nenhuma informação sobre as suas ideias, propostas ou estratégias para a ciência na próxima legislatura.
O desenvolvimento científico e tecnológico está intimamente ligado ao índice de desenvolvimento humano de um país ou região. É fácil de perceber que quando o combate à pobreza e às desigualdades sociais são uma prioridade, não é fácil de justificar e apoiar qualquer actividade secundária que não tente resolver directamente estas questões. No entanto, diversos estudos indicam que investimentos em ciência e tecnologia em situações de crise têm vindo a ajudar países a enfrentar e ultrapassar as mesmas. Isto vem mostrar que o investimento em ciências básicas tem, não só um grande retorno cultural e humano, mas também um retorno económico.
Recentemente, na ocasião da atribuição do maior prémio nacional de cultura e ciência, o Prémio Pessoa, à cientista Maria do Carmo Fonseca, esta falou “da importância da ciência no desenvolvimento do país”. De uma forma simples e clara afirma: “A Ciência tem um enorme potencial para atrair investimento internacional, mas para ter sucesso a ciência portuguesa terá de ser competitiva a nível mundial. (…) Como em todas as áreas da economia, a competitividade nacional exige opções estratégicas sobre investimentos prioritários.” Fica assim lançado o repto aos futuros governantes.
Não esquecendo que o júri do Prémio Pessoa é constituído por algumas das maiores personalidades da sociedade portuguesa, incluindo um ex-Presidente da República e antigos primeiros-ministros, a atribuição do prémio a um cientista, pela terceira vez, vem realçar o papel fulcral que a ciência tem para melhorar a situação económica portuguesa, se o poder político assim o desejar.
Estamos cientes do nosso tamanho: somos um país pequeno, com recursos limitados. Sem esquecer a inovação, a originalidade e a criatividade, temos que perceber onde estão as nossas mais-valias e alinhar os nossos projectos com uma clara estratégia nacional e europeia para a C&T. Só assim podemos potenciar os recursos e investimentos.
Com as eleições legislativas de 2011, urge então perceber quais são os planos, estratégias e visão para a ciência portuguesa que o próximo governo tem para os próximos quatro anos. Temos a certeza que a comunidade científica está preparada para responder, ajudar e trabalhar para contribuir para um melhor Portugal.
Maria José Cruz, 35 anos, editora associada da revista Science
Pedro Russo, 33 anos, coordenador do projecto Universe Awareness, Universidade de Leiden, Holanda
Sílvia Castro, 32 anos, desenvolve projectos de comunicação de ciência e new media