É muito provável que o leitor reconheça (e até identifique) as personagens/ilustrações que reproduzimos nesta página. Talvez antes mesmo de olhar para o nome da autora, registado na capa do livro aqui em cima, o tenha adivinhado: Beatrix Potter, pois então. Não é apenas o traço delicado e as formas suaves que ficam guardadas na memória, é toda uma atmosfera naturalista despreocupada com questões de escala que alguns de nós guardam no mais íntimo e primordial do seu passado infantil. E ainda não estamos a falar de palavras.
Quem não reconhece o Pedro Coelho e não desejou desobedecer como ele? Mesmo sabendo-o algo pateta, medroso e volta e meia sujeito a algum castigo (nem sempre explicitamente assumido como tal), como no conto em que ficámos a conhecê-lo e que abre esta edição recentemente publicada, A História do Pedro Coelho, mas que data de 1902.
Termina assim: “Lamento dizer que o Pedro não passou nada bem o serão. A mãe deitou-o, fez chá de camomila e deu-lhe uma boa dose: — Uma colher de sopa bem cheia ao deitar. A Florinda, a Melinda e a Rabinho-de-Algodão, essas, jantaram pão, leite e amoras.” Estão a ver a ideia?
É preciso recuar 150 anos… para se perceber melhor o contexto em que estas histórias foram criadas e divulgadas. Mas isso são coisas de adultos, as crianças não querem saber disso para nada. Contem-lhes uma boa história e elas não se vão deter a pensar se é de hoje, de ontem ou de amanhã. Se mergulharem nela, sentirem medo, frustração, alegria, felicidade ou qualquer outro sentimento genuíno que as leve a terminar a narrativa com sensações de justiça e segurança, então está tudo bem. Vão querer voltar a escutar a mesma história e outras de valor semelhante.
Contextualizando (para os adultos), Beatrix Potter nasceu em Londres (1866), na era vitoriana, numa família da alta burguesia. Ao que se sabe, teve uma infância solitária e foi educada em casa por preceptoras. No entanto, não lhe fugiu a oportunidade de estudar Pintura e História Natural e manteve o gosto por universos fantásticos, contos de fadas, lengalengas e rimas. Misturou tudo isto e o resultado foi este: durante perto de 30 anos, publicou 23 livros ilustrados.
As suas histórias tornaram-se clássicos da literatura infantil do século XX, foi traduzida em 36 línguas e já vendeu mais de 45 milhões de exemplares em todo o mundo. Destaque para a importância e influência de Annie Carter na sua vida e percurso. Uma preceptora com pouco mais idade que ela, mas culta e viajada. Ficaram muito amigas. Mais tarde, Beatrix começou a enviar histórias ilustradas aos filhos de Annie. Nasciam assim as personagens mais ou menos românticas e irreverentes que muitos de nós conhecemos. A amizade sempre foi um bem precioso.
Os próximos três volumes dos Contos Completos têm publicação agendada para Setembro, Outubro e Novembro. Que bom.
Beatrix Potter — Contos Completos 1
Texto e ilustração: Beatrix Potter
Tradução: Eugénia Antunese Paulo Rêgo
Edição: Pim! Edições
192 págs., 16,60€
(Texto divulgado na edição do Público de 20 de Agosto, na página Crianças.)
Imagens retiradas de uma notícia do Mirror a dar conta do lançamento de vários selos com as personagens criadas por Beatrice Potter. Podem lê-la aqui.
Esta é a página completa da edição em papel, com sugestões de actividades para toda a família. Mais ideias no Guia do Lazer.