Numa cidade “grande e gorda de barulhos”, houve quem parasse espantado a ver Alice deitada no chão de uma esquina. Houve perguntas, apitadelas, cabeças a abanar e sobrolhos que se “amarrotaram”. Mas isso foi antes de Alice começar a cantar, “a sua forma preferida de falar”.
Cantora singular, não cantava de pé, só deitada e ao ar livre. “Acreditava que, assim, a canção poderia acertar e destapar o coração das coisas.” Lançando a canção para o bico dos pássaros, sabia que estes a conduziriam para as nuvens, que a devolveriam à terra dançando com emoção. “Por isso, a chuva canta quando bate nas janelas. Quando cai nos buracos. E liberta perfumes quando embate na terra e mata a sede aos animais e plantas. E põe cores na vida.”
Um livro poético e envolvente, a que facilmente cada um pode associar uma melodia que lhe agrade. Mas tem de ser verdadeira: “A canção verdadeira é aquela que se ouve nos ouvidos, se prova na língua, se cheira no nariz, e se vê na paisagem dos olhos.”
O colorido e expressividade das ilustrações de Maria João Lima acompanham na perfeição esta história musical, a lembrar que o mundo é composto de mudança. E ela própria muda de técnicas ao longo das páginas. Sandro William Junqueira, que se diz um músico falhado, terá de rever essa afirmação. Não é que põe o leitor com vontade de cantar e de dançar?
A Cantora Deitada
Texto: Sandro William Junqueira
Ilustração: Maria João Lima
Edição Caminho
40 págs., 10,90€
(Texto divulgado na edição do Público de 20 de Junho, na página Crianças.)
A ilustradora obriga-nos a virar o livro (ou o pescoço…) várias vezes ao longo da narrativa. O escritor obriga-nos a parar e a tomar atenção ao mundo.
(Uma obra que nos convida a cantar: ♫ ♪♫♪♫ lá, lá, lá, ♫ ♪♫♪♫ lá, lá, lá.)