Confessamos o equívoco levados por um título de jornal: vínhamos à procura do “Quarteirão das Artes” de Ponta Delgada, mas Vítor Marques da Cunha, um dos impulsionadores da iniciativa, desmente-o com um sorriso que esconde alguma tristeza: “Não temos massa crítica nos Açores para ter um quarteirão das artes.” Isto porque, explica, não há escolas de arte no arquipélago e quem vai estudar para o continente dificilmente volta. Prefere chamar quarteirão da cultura, do lazer e do bem-estar.
É o Quarteirão de Ponta Delgada que se está a “construir” desde Janeiro e onde se encontram galerias, ateliers de arquitectura e design, lojas-atelier de moda e artesanato, hostels, cafés, bares, restaurantes, um estúdio de ioga e o único restaurante vegetariano de São Miguel, o Rotas da Ilha Verde, aberto há 10 anos onde antes havia uma casa de chá e de artesanato. Para abrir está uma hamburgueria e uma nova loja de design e artesanato.
Ainda não há uma “movida”, mas já há troca de sinergias nos que já estavam há muitos anos (como a galeria Fonseca Macedo, que abriu em 2000), nos que acabaram de chegar (a Miolo de Vítor Marques da Cunha e Mário Roberto, livraria e galeria, ou o Estúdio, onde Sara França trabalha e apresenta as suas peças de roupa, dividindo espaço, e projectos, com Fábio Oliveira, que trabalha com pele) e nos que estão para chegar.
Vindos da “baixa” tradicional, a que rodeia a igreja matriz (do século XVI e reformada no século XVIII), o Quarteirão começa na Rua Machado dos Santos e vai até à Rua Guilherme Poças Falcão, dividindo-se em três ruas (Carvalho Araújo, Pedro Homem e d’Água), no que constitui uma espécie de enclave, onde, como diz Fátima Mota, da Galeria Fonseca Macedo, “o que se quer é ser feliz”. E que cada um traga mais um amigo também – que é como quem diz, vizinhos, como aqui todos se tratam, nota Catarina, da Rotas da Ilha Verde (não é à toa que este ano se vai realizar a quarta edição do Dia do Vizinho – “deveria ser o apartado 9500 porque vem a ilha toda”, brinca). Afinal, há muitos espaços vazios à espera de ideias para ganharem nova vida.
A dar os primeiros passos, no Quarteirão já há inaugurações simultâneas nas galerias aqui presentes, o que é sempre pretexto para festa, ainda que as ruas estreitas, de passeios quase inexistentes, não tornem a missão fácil. Sabem que é difícil, se não impossível, tornar esta zona pedonal, como aconteceu na Baixa da cidade, mas procuram soluções para tornar o trânsito mais controlado (em termos de velocidade). E o próximo festival Walk & Talk, cujas ramificações são visíveis nas paredes um pouco por toda a cidade (com intromissões), que terá como tema a arquitectura e o design, já elegeu esta como uma das áreas da cidade que será entregue a curadores que terão como missão criar uma sinalética e mobiliário urbano distintivos. Tudo para tornar um quarteirão no Quarteirão.
Andreia Marques Pereira (texto) e Paulo Pimenta (fotos) viajam com o apoio da Direcção Regional de Turismo dos Açores
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