Já cá tinham estado Vladimir Putin e Rod Stewart – as fotografias não deixam ninguém mentir – e, dizem as más línguas, também o antigo presidente dos Estados Unidos, George W. Bush – até prova em contrário, acreditamos e vendemos o peixe ao preço a que o compramos. Hoje somos nós e só esperamos que não haja registos da nossa figura ao experimentar uma sopa de três elefantes.
O Blue Elephant é uma instituição em Banguecoque, graças ao talento culinário da chef Nooror Somany, cuja aventura começou em 1980, em Bruxelas. Foi lá que abriu o seu primeiro restaurante – outros se seguiriam, de Londres ao Dubai, e Banguecoque haveria de esperar por 2002 para trazer a mão de Nooror para a cozinha novamente para casa.
O Blue Elephant Banguecoque funciona no Thai Chine Building, um elegante edifício datado de 1903. Foi parcialmente renovado em 2000 e adaptado aos propósitos de Nooror. Nos seus três andares, espalham-se agora várias salas de refeições, requintadamente decoradas em estilo tailandês, e uma escola de cozinha que ganhou fama no mundo inteiro. Por 80 euros, qualquer pessoa pode iniciar-se no mundo maravilhoso da cozinha tailandesa (aulas de manhã e de tarde), mas há pacotes mais alargados para os que querem conhecer todos os segredos da mesa da Tailândia.
Pela parte que nos toca, estamos cá apenas para comer. Calhou-nos uma mesa redonda, aparelhada ao mais alto nível. Mesmo para quem, como nós, tem estômago fraco, a cozinha tailandesa é um verdadeiro festim para os sentidos. É perfumadíssima e quem não achar que esta é porventura a culinária mais bonita do planeta que atire a primeira pedra. Quem resiste aos vegetais esculpidos milimetricamente nas mais diversas formas, verdadeiras obras de arte, ou às trouxinhas de folha de bananeira?
Até começamos bem: chegam as entradas e, embora não saibamos exactamente ao que vamos, percebemos que neste jogo isso não é, por agora, o mais importante. Vale é saber se o que levamos à boca nos vai pôr a ferro e fogo.
Passamos o teste das entradas (que incluem camarões, cogumelos, pomelos, umas espetadinhas de galinha e milhentas coisas que não identificamos) e já temos à frente uma sopa. Vem à mesa num pote pequenino, onde vemos um caldo ligeiramente leitoso e dois camarões a boiar. Bebemos primeiro a água, com jeitinho, e constatamos que pica um bocadinho, sim senhor, mas já vimos coisas piores.
Terá sido excesso de confiança? À terceira colherada trincamos qualquer coisa e é o caos. Arde-nos tudo, da boca ao nariz, dos olhos à garganta – do cabelo às unhas dos pés. E o que fazer com o que temos na boca? Fechamos os olhos, engolimos, e procuramos refúgio na limonada (de lima) deliciosa que nos serviram.
Só depois percebemos que a ementa que temos na mesa nos avisara que esta sopa não é para meninos como nós. No Blue Elephant, a intensidade do picante que é um modo de vida na Tailândia mede-se pelo número de elefantes que tem à frente. Esta sopa tem três e para nós está tudo dito.
Daqui para a frente, o segredo é contar elefantes. Ainda há-de chegar um caril de caranguejo quatro elefantes: não, obrigada, ficamo-nos pelos noodles zero elefantes e pelo pato dois elefantes e meio e a refeição termina em beleza. Tudo está bem quando acaba bem e agora já temos santo-e-senha: quantos elefantes aguentas?
“Sà-wàt-dee-kaa”, Banguecoque – que é como quem diz, olá, bom dia, boa tarde, boa noite. Às vezes também vale para adeus, mas ainda não é o nosso caso.
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Sandra Silva Costa viaja a convite da Autoridade de Turismo da Tailândia
Escreve bem, esta Sandra.