Ao longo desta semana, Joana Amaral Cardoso, no Rio de Janeiro, e Tiago Bartolomeu Costa, em Macau e depois Hong Kong, trocam cartas de viagem a mais de 17 mil quilómetros de distância. Duas realidades, onde o português ainda é língua, em dois países emergentes, duas pontas do BRIC (sigla que une quatro países emergentes — Brasil, Rússia, Índia e China)
Há um morro de luto por causa de um bonde. Mais precisamente, Santa Teresa pede a cada curva e contracurva de uma subida inclemente, que o seu bonde seja livre, para todos. Enquanto subia, só soube que havia a luta. Quando desci, percebi que havia o luto.
Os bondes de Santa Teresa são a especialidade local do bairro. Vêm de lá de baixo, como eu subi, dos Arcos da Lapa, o bairro que de repente se tornou um sítio quente para comer bem e beber melhor, sem se gentrificar em demasia. E trepam aquela colina empedrada, elegante na sua decadência e às vezes prestes a ser engolida pela vegetação. Aliás, e porque me disseste que me ias falar de borboletas e afins bucóliquices, os bondes eram verdes mas a gente do bairro não conseguia distingui-los bem das palmeiras e outro arvoredo. E passaram a ser amarelos, como uns veículos que eu cá sei e cujo nome começa por “e” e acaba em “o” e no meio envolve “létric”. Uma série de acidentes, daqueles mesmo à séria que matam gente, pôs em causa estas linhas. Daí o luto.
Nos entretantos, houve um almoço num hotel inesperado, numa zona que não parece o Rio do costume (nem o da favela, nem o do centro arranhado, nem o da praia aos gomos de laranja, nem o dos morros tisnados de verde, nem o do luxo do Leblon). Encavalitada numa nesga de colina, finalmente uma refeição à brasileira. Puré de banana a acompanhar peixes misteriosos, queijo minas panado com palmito grelhado, essas coisas.

O Rio hoje continuou a vogar da janela da van, um pingue-pongue numa bolha às vezes demasiado protegida. Um dia destes ainda subo ao Pão de Açúcar. Um menino que não pode ter mais de seis anos faz malabarismo com três bolas frente aos carros. Distracção em Copacabana, muito cedo. Um “pssssiu! bom dia”, silva por cima da cabeça. Susto. “Não é assaltante não”, sorri o vendedor de pipocas e salgadinhos. “O assaltante não diz bom dia.” É.