Alguém pode deslocar aquelas nuvens, por favor?
Estamos no pico Saulire, a 2732 metros de altitude, e, diz quem sabe, se o dia estivesse totalmente claro veríamos o Monte Branco na perfeição – hoje, contudo, temos que nos contentar com a visão de uma pequena parte daquela que é a mais alta montanha da Europa Ocidental (mais de 4800 metros).
Chegámos a este (quase) deserto branco depois de duas boleias, uma de gôndola e outra de um enorme teleférico. Há vertigens para estes lados, pelo que quase todo o caminho foi feito de olhos bem fechados. Está frio a esta altitude, mas sentimo-lo sobretudo na cara e nas mãos, quando as livramos das luvas para podermos guardar no cartão de memória esta paisagem sublime.
A esplanada sobre os Alpes do restaurante Le Panoramique parece um parque de estacionamento de esquis. As cadeiras com vista para os picos nevados estão praticamente lotadas – há que descansar o corpo e alegrar os olhos e, em muitos casos, preparar a descida pela pista vermelha que a partir daqui se desenrola.
Isso não é para mim, evidentemente. Aprecio uma deliciosa “tartiflette” dentro de portas e depois volto a entrar no teleférico que me deixa às portas de uma nova pista verde. Não contava, porém, com o que estava para vir.
Terá sido do intervalo para almoço, ou pura falta de queda para a coisa (se bem que, em abono da verdade, tenho queda para as quedas…), mas de repente parece-me que esqueci tudo o que Jacques me ensinara.
E, confesso, não estava preparada para entrar numa pista a sério – ainda que verde e ainda que com a protecção omnipresente do instrutor de esqui.
As pernas tremem-me, não me lembro de como se fazem as curvas, os joelhos doem-me, e há uma pista imensa à nossa frente. A verdade é esta: apetece-me gritar de medo. E só não o faço porque, ao meu lado, um grupo de crianças de cinco, seis anos, desce a pista alegremente.
Há um momento em que desisto e peço a Jacques para parar. Tiro os esquis e entretanto percebo que caminhar sobre a neve, nesta descida, também não é fácil. É pior a emenda que o soneto. Tenho que voltar aos esquis e ao terror de um trambolhão nesta auto-estrada branca.
Só volto a respirar quando vejo à minha frente o final da pista Jardin Alpin. Há terra firme ali ao lado. Desculpa, Jacques, mas isto não é para mim. Experimentei tarde de mais, burro velho não aprende línguas.
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Sandra Silva Costa (texto) e Enric-Vives Rubio (fotos) viajam a convite da TAP e do Hotel La Sivolière