Pista verde e uma nódoa negra


Sobreviver, sobrevivi – pelo menos até agora.

Ainda não são 8h, abro a janela do quarto e percebo, finalmente, como é Courchevel. Está uma manhã clara, de céu azul, e o sol há-de aparecer não tarda. Só hoje consigo pôr os olhos nas montanhas nevadas que rodeiam a vila feita de chalés de madeira – e só hoje percebo melhor de onde lhe advém todo o charme  e “glamour”.

As casinhas de madeira com quilos de neve amontoada nos telhados compõem metade da moldura. São na sua maior parte construções de bom gosto, que albergam lojas de luxo (joalharias são aos montes) ou hotéis de quatro ou cinco estrelas. Se estivessem à venda – que não estão – alguns destes chalés chegariam facilmente aos 50 milhões de euros. Alugá-los pode custar 200 mil euros… por semana, adianta Jacques Dupuy, instrutor de esqui há mais de 30 anos. Quer-nos parecer que o solo de Courchevel vale ouro.

Será também às custas da neve “de altíssima qualidade”, como a classifica Jacques, que se tricota a fama desta que é uma das três estâncias (as outras duas são Méribel e Val Thorens) que compõem os Três Vales franceses – tudo somado, “et voilà”, sejam bem-vindos ao maior domínio esquiável do mundo, com mais de 600 pistas.


Mas estamos em Courchevel e é por aqui que nos vamos deixar ficar. Perto das 9h, descemos à Ski Shop do Hotel La Sivolière para recolher o material e eis o primeiro choque: não podiam ter inventado umas botas de esqui menos duras, não? Andar dentro delas é uma aventura nos primeiros minutos – e uma tortura nos restantes.

Jacques, um francês de 52 anos que pinta praticamente toda a sua vida com neve e que fala um português com sotaque do Brasil, encaminha-nos para a zona dos principiantes. É um troço de pista verde (as verdes são as mais fáceis, naturalmente) onde estão instalados uns tapetes rolantes que aqui recebem o nome de “magic carpets”. À vista desarmada – ou sem estes esquis nos pés – diríamos que o terreno aqui é totalmente plano. Com os esquis, porém, já percebemos que estes desníveis (mais do que ténues, repetimos) são armadilhas no caminho de alguém que ainda não sabe sequer como dar passos com estes “pés” enormes.


Os pés apertam-se dentro das botas, as canelas estão esmagadas e movimentar os esquis exige concentração – é fundamental perceber que devemos mexer um pé de cada vez. Mas Jacques é um professor paciente. Daqui a uns minutos já nos equilibramos e até já aprendemos a travar – quase temos vontade de nos deixarmos ir por aquela descidinha tão convidativa à nossa frente. Até que, quando estamos quase a saber curvar, acontece a primeira queda. “Pas grave”, incentiva Jacques.

A próxima será ligeiramente mais grave, meu caro Jacques: o joelho tem direito a nódoa negra mas ainda não há-de ser agora que vamos desistir.


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Sandra Silva Costa (texto) e Enric-Vives Rubio (fotos) viajam a convite da TAP e do Hotel La Sivolière
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4 comentários a Pista verde e uma nódoa negra

  1. Olá Sandra, Parabéns pela reportagem..
    Na próxima semana irei pela segunda vez à Corchevel esquiar, estava procurando um instrutor que fale português quando encontrei a sua materia.
    teria como você me fornecer o contato do Jacques??
    Grato
    Mauro

    Responder
    • Olá Mauro, basta entrar no site da École du Sky Français em Courchevel e tem todas as informações, incluindo contactos do Jacques. Esquie para aqui

      Boa jornada em Courchevel!

      Responder
  2. Lindo lindo lindo. Aprecio o frio em depoimento ao calor. E como “snowboarder” iniciante (com “aquele bichinho”), vi as imagens com um sorriso lerdo (reparei quando “acordei”) a imaginar-me na imensidão branca, com uma sensação grande de poder por ser um pontinho às cores no meio de toda essa neve sem fim. Parabéns aos dois. Texto simples e captador e imagens de “prender” os olhos.
    Continuação e coragem para o ski que daqui a pouco já passam passa para as azúis.
    E se demorar mais que um pouco, “c’est pas grave”. :)

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