Acordámos estremunhados, com o telemóvel a tocar, ainda não eram 8h00. “É o Marco. Está um dia magnífico, se quiserem fazer um passeio antes do voo, é pegar ou largar.” Largámos tudo – a cama, a mala por acabar, o pequeno-almoço (quase) – e pegámos, pois claro. Estava de facto uma bela manhã e começámos a pensar que sim, seria desta.
Fomos subindo em direcção às lagoas debaixo de uma luz como nunca tínhamos visto a esta altitude. E é quase cruel que tenhamos passado a entrada para a lagoa da Lomba sem lhe ligarmos nenhuma – ontem já a tínhamos visto em toda a sua extensão, ainda que enquadrada pelo nevoeiro do costume. Hoje era preciso lutar contra o tempo e correr contra as nuvens para podermos ver as outras.
À medida que subíamos, o semblante de Marco ia ficando mais carregado. “Já tenho dúvidas…” Até que… “Fecha os olhos.” Abrimo-los e à nossa frente temos a lagoa Comprida – já lhe tínhamos descortinado uns centímetros, mas agora ela oferece-se-nos na sua plenitude. Ainda não são 9h00 e só cá estamos nós. O céu não está completamente limpo, a luz talvez não seja a que mais faz justiça ao cenário, mas para nós, que quase nos resignáramos a voltar para casa sem lhes pormos a vista em cima, o momento é praticamente solene.
Uns metros mais acima e damos de caras com a Negra: tem a forma de uma circunferência quase perfeita e está rodeada de espécies endémicas: cedro do mato, queiró, louro. Hortênsias não há aos montes, mas as que há sobressaem deste verde que, acreditamos, pode cegar em dias límpidos.
Num plano superior, vemos o varandim de outro miradouro e subimos as escadas. Não contávamos com o que temos agora à frente dos olhos: as duas lagoas, Comprida e Negra, estão praticamente lado a lado, ou, se preferirmos, de costas voltadas, numa sintonia descasada quase dramática.
Entramos no jipe com a alma cheia. E quando, em simultâneo, alcançamos com o olhar as lagoas Funda e Rasa, damos muito mais valor ao momento. Era justificada a angústia dos últimos dias: não podíamos deixar as Flores sem levarmos connosco estas imagens de assombro e rendição. Valeram a pena todos os minutos a jogar ao gato e ao rato com a neblina, todos os quilómetros feitos à volta da ilha. E também valeu a pena escrever ao São Pedro.
Tudo está bem quando acaba bem.
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[Sandra Silva Costa e Paulo Ricca (fotos) viajam esta semana pelos Açores]
Veja aqui a fotogaleria As 9 Maravilhas dos Açores por Paulo Ricca