Aparentemente, a aparição de Mitt Romney no inofensivo “Tonight Show” de Jay Leno revelou-se um verdadeiro desastre. Nesta altura do campeonato, a campanha do ex-governador do Massachusetts já deve estar habituada a resolver situações de crise da sua inteira responsabilidade: surpreendentemente, tanto o candidato como os seus assessores têm exibido uma notável capacidade de inverter um ciclo mediático francamente positivo com declarações polémicas e desajustadas. É uma peculiaridade inesperada de uma candidatura que é repetidamente apontada como um triunfo de disciplina, profissionalismo e organização.
A entrevista com Jay Leno é um de muitos exemplos de uma boa oportunidade desperdiçada por Romney — e da sua manifesta incapacidade de se comportar com naturalidade. Não há nada na chamada “late-night television” que remeta para a uma postura séria, mas mesmo quando ensaiou dizer umas piadas, Romney não conseguiu disfarçar a sua rigidez. E esse até foi o menor dos problemas da sua actuação no Leno: o pior foi quando uma questão simples sobre o acesso à saúde — em particular, sobre a provisão da lei assinada por Barack Obama que impede as companhias de seguro de recusar cobertura a pessoas com doenças crónicas — voltou a revelar a tendência de Romney de pôr o pé na argola.
A presença do candidato no “Tonight Show” deveria ser uma espécie de volta de honra numa semana recheada de boas notícias: as declarações de apoio do antigo Presidente George H. Bush e do senador da Florida Marco Rubio, que cimentam as credenciais de Romney entre a elite da política externa que aprecia Bush (e sinaliza a ordem do establishment republicano para definir o resultado da corrida) e o eleitorado hispânico e do Tea Party que se revê em Rubio; os desenvolvimentos do processo contra o Obamacare no Supremo Tribunal, que parece inclinado para “aplicar” um duro golpe nas pretensões do Presidente; a desintegração virtual da campanha de Newt Gingrich, que já viu o seu principal financiador, o milionário Sheldon Adelson, encetar negociações com a campanha de Romney …
Romney pode ter atrás de si uma máquina bem oleada, e um cofre aparentemente sem fundo, mas precisa de parar de dar tiros nos pés. Até porque os desafios não vão desaparecer, e o candidato ainda não encontrou uma solução para a maior crise a ensombrar a sua candidatura: neste momento, mais de metade dos eleitores americanos dizer ter uma opinião negativa de Mitt Romney.
P.S. O congressista do Wisconsin Paul Ryan, presidente do importante comité do orçamento da Câmara de Representantes e autor da proposta de Orçamento apresentada pelos republicanos, acaba de declarar o seu apoio a Romney, que lidera as sondagens para as primárias daquele estado, na próxima terça-feira.
Rita Siza