Para que não restem dúvidas

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Nunca mais me esqueci. Foi há anos num colóquio em sobre Machado de Assis, em Lisboa, que o professor de Literatura Brasileira na Universidade Nova de Lisboa, Abel Barros Baptista, disse que “Memórias Póstumas de Brás Cubas” era “uma obra extravagante em qualquer parte do mundo”.

Sabe-se que Machado de Assis (1839-1908) frequentou o Real Gabinete Português de Leitura, no Rio de Janeiro, que servia também de depósito legal, todos os autores portugueses estavam ali disponíveis. Aos 13 e 14 anos já por lá andava e leu aqueles que para o professor e filólogo brasileiro Evanildo Bechara, são “incontestavelmente os grandes mestres da ilustração da língua”.

Na impossibilidade de irmos também passar os nossos dias no Real Gabinete Português de Leitura podemos navegar na Internet e encontrar as obras deste filho de um escravo mulato (pintor de tectos de casas e igrejas) e de uma portuguesa açoriana que passou a infância no “morro” do Livramento, no Rio do Janeiro, mas frequentava o mundo dos ricos na “chacra” do Livramento, a casa de Dona Maria José de Mendonça Barroso, sua madrinha. Fez carreira como funcionário público no Ministério da Agricultura e só depois de ter casado, em 1869, com Carolina, uma portuguesa, culta, mais velha do que ele, é que começou a produzir as obras que lhe trouxeram a posteridade.

Havia a ideia de que o léxico de Machado de Assis andaria à volta de duas a três mil palavras. Mas quando se comemorou o seu centenário, em 2008, foi feito um levantamento do seu léxico e foram recolhidas quase nove mil palavras diferentes.

É um divertimento ler a obra de Machado de Assis em hipertexto no “site” lançado pela Fundação Casa de Rui Barbosa. Ainda não está disponível o famoso “Memórias Póstumas de Brás Cubas” mas já estão acessíveis os seus primeiros romances “Ressurreição”, “A mão e a luva”, “Helena” e “Iaiá Garcia”. De que se trata? Estamos a ler o romance e vamos clicando nas palavras sublinhadas.

São “links” para explicações mais aprofundadas do que ali se passa. Para entendermos tudo. Na introdução, a investigadora Marta de Senna explica: “Nesta edição, preparada com o cuidado necessário para torná-la fidedigna, o leitor poderá não apenas desfrutar o romance em si, mas também achar, nas notas em forma de ‘links’, explicações sobre todas as citações e alusões do texto: tanto as de natureza simbólica (autores, obras de arte, personagens, factos históricos referidos por Machado de Assis), como as menções a lugares e instituições não ficcionais (bairros e ruas da cidade do Rio de Janeiro, lojas, teatros, cafés que as personagens machadianas frequentam).”

Também no “site” Machado de Assis.net, lançado pela Fundação Casa de Rui Barbosa, está disponível o número 4 da revista electrónica de estudos machadianos, “Machado de Assis em linha”. A revista é semestral e esta edição tem um ensaio da tradição crítica escrito por Lucia Miguel Pereira, pioneira dos estudos sobre o autor no Brasil e um artigo inédito do académico Alfredo Bosi.
A revista é editada por Marta de Senna, da Fundação Casa de Rui Barbosa, em conjunto com o professor Hélio de Seixas Guimarães, da Universidade de São Paulo.

Para quem ainda não sabe: no Portal Domínio Público -a biblioteca digital do Ministério da Educação brasileiro, estão disponíveis em PDF, para serem descarregados para o computador ou leitores de e-books, as obras machadianas : “Ressurreição” (1872), “A Mão e a Luva” (1874), “Helena” (1876), “Iaiá Garcia” (1878), “Memórias Póstumas de Brás Cubas (1881), “Casa Velha” (1885), “Quincas Borba” (1891), “Dom Casmurro” (1899), “Esaú e Jacó” (1904) e “Memorial de Aires” (1908). Gratuitamente.

Machado de Assis em linha
http://www.machadodeassis.net/

Na Academia Brasileira de Letras
http://www.machadodeassis.org.br/

Obra completa em PDF
http://machado.mec.gov.br

(crónica publicada no suplemento ípsilon, do jornal PÚBLICO de dia 7 de Maio de 2010)

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2 comentários a Para que não restem dúvidas

  1. Eu sei que o post é sobre Machado de Assis, mas a referência ao professor Abel Barros Baptista prendeu-me. Tive a felicidade de ser sua aluna. Espero que os seus ensinamentos continuem a encantar muita gente.

  2. Isabel, concordo com Abel Barros Baptista.

    Há mais ou menos 2 anos, convenci o amigo Brian Boyd, maior autoridade mundial na obra de Vladimir Nabokov, a olhar com carinho a possibilidade de um estudo sobre a obra do nosso Machado de Assis.

    O resultado foi a palestra “Machado e Nabokov”, proferida em setembro de 2009 na Academia Brasileira de Letras (estou traduzindo a palestra para publicação na Revista Brasileira da ABL).

    Mas, não parou aí. Semana passada, Brian, ainda entusiasmado com Machado, me avisou que iniciará um curso para 200 alunos da Universidade de Auckland, Nova Zelândia, sobre “Memórias Póstumas de Brás Cubas”.

    Compartilho com seus leitores dois textos: 1) a entrevista que fiz com Brian por ocasião de sua visita ao Brasil: http://bit.ly/aMzW0W . 2) um artigo que escrevi sobre Machado e o xadrez, publicado no dossiê Machado de Assis, da Revista de História da Biblioteca Nacional (Brasil): http://bit.ly/bsbcXj . Esse artigo está sendo ampliado para um estudo sobre literatura e xadrez abordando 64 escritores-enxadristas.

    Forte abraço,
    C. S. Soares

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