Se todos fossem iguais a você

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(Foto de Ana Lontra Jobim, 1990, ACJ tocando piano ao lado da filha, Maria Luiza, vestida de bailarina, imagem que faz parte do acervo de Tom Jobim)

Ciberescritas

Isabel.Coutinho@publico.pt

“A ‘Garota de Ipanema’ é aquele negócio que a gente não sabe direito porque é que fez, não é?”, vê-se Tom Jobim a dizer a Vinicius de Moraes numa conversa em que também participou Toquinho e foi gravada nos estúdios da Globo, em 1977.

Vinicius está a contar como conheceu Jobim e diz que existem várias versões sobre esse primeiro encontro. O poeta estava num bar no Rio de Janeiro, com Lúcio Rangel, quando foi apresentado ao maestro que tocava piano no bar. Vinicius andava à procura de um músico para fazer a banda sonora da peça “Orfeu da Conceição” mas não queria “pegar um monstro sagrado”. “Lembra?”, pergunta o poeta a Jobim. “Claro que me lembro”, responde o músico encabulado e a fumar charuto. E então conta que nessa altura em que estava a ser convidado para trabalhar em parceria com Vinicius, ano 1956, cometeu a gafe de lhe perguntar se “tinha um dinheirinho nisso”.

Tom Jobim estava muito pobre, o seu filho Paulo tinha acabado de nascer, ele passava o tempo a transportar debaixo do braço uma pasta com partituras e a fazer arranjos para cantoras. Tinha nascido na Tijuca (1927-1994) mas crescido em Ipanema. Chegou a estudar arquitectura.

No final do ano passado, 15 anos após a sua morte, o Instituto Antônio Carlos Jobim, criado em 2001, disponibilizou online o acervo do maestro. Ao que se sabe, Jobim não era organizado. As suas partituras e os papéis com as letras das músicas andavam espalhados por todos os cantos da casa e só em 1980 a segunda mulher do maestro, Ana Lontra Jobim, pediu a Vera Alencar para organizar o acervo. Segundo a “Veja”, o maestro passou logo a chamar à organizadora a sua “taxidermista” (especialista em empalhar animais).

Actualmente, quem está à frente do Instituto é o seu filho mais velho, Paulo. Além do acervo do maestro, o instituto organizou e digitalizou o acervo e documentos pessoais do cantor e compositor baiano Dorival Caymmi e do arquitecto Lúcio Costa, e trabalha agora no de Chico Buarque, que ficará disponível no Verão, diz o “Jornal do Brasil”.

Para já, quase todo o Jobim está disponível neste site que recebe mais de 400 visitas por dia. Estão lá mais de 30 mil documentos de texto, fotografias, vídeos e ficheiros áudio. Alguns estão logo acessíveis, outros necessitam que se faça uma inscrição, e para isso é necessário colocar um endereço de correio electrónico (deu-me sempre erro, nunca consegui).

Estão lá os rascunhos da canção que começou com o famoso verso escrito por Chico, “Vou te contar”, e todo o esforço de Jobim para continuar essa letra num dos seus caderninhos. Estão lá também o rascunho de “Desafinado”, escrito em parceria com Newton Mendonça (a canção de “fotografei você na minha Rolleiflex”), e gravações áudio em que Jobim está a compor ao piano, no seu velho Welmar, e vai cantarolando músicas inéditas. Somos surpreendidos pela entrada dos filhos, com risos e conversas sobre “botar o pijama e ir dormir”. É muito engraçado.

Ah! “Se todos fossem no mundo iguais a você”, como cantava Vinicius…

Acervo digital de Tom Jobim
http://www.jobim.org

(crónica publicada no suplemento ípsilon do jornal PÚBLICO de 12 de Março de 2010)

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