A ciência da migração das cegonhas

O estudo das rotas migratórias da cegonha-branca iniciou-se com um ornitólogo alemão chamado Johannes Thienemann, pioneiro na anilhagem de aves e que começou, com a recaptura de alguns indivíduos marcados, a perceber a dinâmica das populações.

A ciência das migrações foi-se desenvolvendo ao longo dos anos e sabe-se agora que as populações de cegonha-branca não residentes invernam na savana africana desde o Quénia, Uganda até à África do Sul, onde se juntam grupos de mais de mil indivíduos. Alguns grupos divergem ainda para o Sudão e para o Chade, chegando mesmo à Nigéria. Na Primavera, como todos sabemos, as aves regressam a norte, chegando à Europa em Março depois de uma viagem que dura perto de 50 dias. Já a viagem invernal para sul demora metade desse tempo, já que as aves contam com vento de cauda e aumentam a sua velocidade média quando sobrevoam zonas de escassez de recursos.

Existem basicamente duas rotas principais que as cegonhas-brancas que nidificam na Europa Central utilizam nas suas travessias euro-africanas, e ambas visam evitar uma longa travessia marítima sobre o Mediterrâneo. A rota de leste, que atravessa a Turquia, passa pelo Sahara e percorre o vale do rio Nilo para sul e a rota de oeste que atravessa o Estreito de Gibraltar. Estes corredores de migração são utilizados também pela presença de correntes de ar quente que permitem às aves poupar energia nas deslocações.

A rota leste apresenta-se como a rota mais importante já que anualmente cerca de 530.000 indivíduos utilizam este corredor, no entanto é apenas a segunda espécie mais representada, já que o Bútio-vespeiro (Pernis apivorus) é a mais representada. Os bandos formados por cegonhas, aves de rapina e outras aves podem nesta zona alcançar dimensões de 200 km.

Já as jovens aves que pela primeira vez partem rumo aos destinos de invernada, para sul, são muitas vezes incapazes de contrariar algumas condições atmosféricas que encontram pelo caminho, acabando por divergir nos destinos e ocupando novas zonas, o que não acontece nos adultos que, através da procura de ventos fortes, conseguem acabar no local onde costumam invernar.

Em termos energéticos, as cegonhas dependem da ascensão de massas de ar quente para planarem e assim percorrerem grandes distâncias nas suas migrações anuais. Embora a rota mais curta fosse atravessar o mar Mediterrâneo, energeticamente essa travessia não é compensatória já que as massas de ar quente não se formam sobre o mar e a travessia seria energeticamente muito mais dispendiosa. Um estudo de 1996, realizado com aves de rapina, mostrou que para a mesma distância percorrida, o bater das asas metaboliza 23 vezes mais gordura corporal que o voo planado. Percebe-se assim o porquê de as cegonhas fazerem travessias continentais e não marítimas ainda que estas se apresentem mais curtas.

Tiago Neves, Bio3

 

Bibliografia:

Spaar, Reto; Bruderer, Bruno. (1996). “Soaring Migration of Steppe Eagles Aquila nipalensis in Southern Israel: Flight Behaviour under Various Wind and Thermal Conditions” (PDF). Journal of Avian Biology 27 (4): 289–301. DOI:10.2307/3677260.

3 comentários a A ciência da migração das cegonhas

  1. As cegonhas que nidificam em Portugal migram para sul ou para norte? E porquê a sua chegada ocorre a meio do outono (já cá estão) e a partida entre maio e junho? Portugal e em particular as zonas do Ribatejo e Alentejo tem um calendário de presenças completamente diferente do que é referido neste estudo. Quais as razões. Agradeço os esclarecimentos que me possam ser prestados. Muito obrigado. Cumprimentos, José Luis Cruz

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