O processo de privatização da TAP não cumpre os requisitos mínimos de transparência e coloca as maiores dúvidas quanto à defesa do interesse público, acusa a TIAC – Transparência e Integridade, Associação Cívica, representante portuguesa da rede global anti-corrupção Transparency International. O Governo deve por isso anular todo o processo e começar de novo, de forma transparente e participada.
“O processo de venda da empresa é um tratado de opacidade. E não é por os ministros das Finanças e da Economia proclamarem a transparência do negócio que ele se torna, de repente, transparente. Todas as regras mínimas de escrutínio foram ignoradas; e temos agora a situação caricata de vermos o Governo entregar a um único candidato uma empresa pública estratégica na qual os portugueses investiram o dinheiro dos seus impostos ao longo de décadas, sem que se percebam os contornos do processo ou de que forma fica salvaguardado o interesse público”, diz o presidente da TIAC, Luís de Sousa.
Segundo as últimas notícias, a privatização da TAP deverá ser decidida já hoje em Conselho de Ministros. A acontecer, será o triunfo de um processo de negociação privada de um bem público, feita à margem de qualquer escrutínio independente.
A TIAC entregou ao Governo, ao Parlamento e à Troika, em junho do ano passado, um documento detalhando medidas concretas para prevenir riscos de corrupção nas reformas acordadas no memorando de entendimento. No que toca às privatizações, a associação fez quatro recomendações essenciais:
– Criação e implementação de um organismo de acompanhamento, avaliação e monitorização dos processos de privatização. Especial atenção deverá ser dada ao formato, composição, independência e capacitação deste órgão, assim como a sua articulação com os demais mecanismos de controlo;
– Dotar as entidades fiscalizadoras e de supervisão (Assembleia da República, Tribunal de Contas, Comissão Mercado de Valores Mobiliários, Alta Autoridade para a Concorrência) de meios que as tornem mais eficazes na sua intervenção;
– Criação de uma bolsa de avaliadores qualificados/credenciados e de modelos de avaliação de propostas;
– Criação de uma base de dados pública com divulgação de forma estruturada, sistemática e clara dos procedimentos adotados em todos os processos de privatização, com vista a potenciar um processo mais transparente e garantir a livre concorrência.
“No caso da TAP, o Governo não cumpre os mínimos. Antes sequer de iniciar o processo, devia ter ouvido os sindicatos e gestores da TAP e um grupo alargado de economistas, especialistas em transporte aéreo, operadores turísticos nacionais e representantes da sociedade civil, para que ficasse definido de forma clara e transparente todo o processo. Devia ter criado uma comissão de monitorização alargada, em vez de um comité de nomeação política que toma posse já com o processo arrumado. É também preocupante o silêncio dos organismos que têm competências preventivas diretas ou indiretas neste processo, nomeadamente, o DCIAP, o Conselho de Prevenção da Corrupção ou até mesmo a Autoridade da Concorrência. Virem a público opinar ou oferecer conselhos pós-venda, como aconteceu no caso da EDP, é inútil”, alerta Luís de Sousa.
Recorde-se que em novembro passado, foi o próprio secretário de Estado dos Transportes, Sérgio Monteiro, que admitiu em entrevista à TSF que a privatização da TAP daria pouco lucro ao Estado, o que coloca dúvidas sobre as vantagens do negócio. E as notícias vindas a público sobre o papel do ministro Miguel Relvas e do ex-ministro brasileiro José Dirceu – condenado a dez anos de prisão no caso Mensalão – só vêm adensar as dúvidas sobre um processo inquinado à partida. Sobre Miguel Relvas paira uma suspeição de falta de isenção que mina a credibilidade do Governo na condução dos processos de privatização.
Nesta altura, já não é suficiente que o Governo explique as eventuais ligações entre o ministro da presidência e o único candidato à compra da TAP; Relvas deve ser imediatamente afastado de todo este processo. “O papel do ministro Miguel Relvas só prejudica a credibilidade do Governo em todo este negócio. Até os parceiros da coligação estão cientes disso, embora não o afirmem publicamente por razões de estabilidade governamental. A seguir à TAP virá a RTP, onde as suspeitas de conflitos de interesse de Relvas só se adensam. O PM já deveria ter tomado uma posição sobre este politico de negócios que tem dado mais problemas ao Governo do que boas prestações”, afirma Luís de Sousa.